Depois do ataque a uma capela na Diocese de Dori, no domingo, 25 de Fevereiro, em que pelo menos 15 cristãos foram assassinados, o Bispo de Ouahigouya descreve à Fundação AIS que a ameaça terrorista é enorme no Burquina Fasso e que há já paróquias bloqueadas, onde “ninguém pode entrar ou sair”. No entanto, neste ambiente de puro terror, há sinais de enorme coragem por parte dos fiéis que enfrentam os grupos armados sem nunca renegarem a fé. “Alguns dos cristãos aceitam morrer”, diz D. Justin Kientega.
“Os terroristas chegam de moto às aldeias, reúnem as pessoas e dizem-lhes para não irem à escola, para não obedecerem à administração pública, e instruem os homens para deixarem crescer a barba e as mulheres para usarem o véu islâmico”, explicou D. Justin Kientega, Bispo de Ouahigouya, uma Diocese no noroeste do Burquina Fasso, numa conferência online, organizada na semana passada pela Fundação AIS Internacional.
“Por vezes, pegam numa pessoa e matam-na à frente de toda a gente”, acrescentou o prelado. Depois do ataque a uma capela no vilarejo de Essakane, no domingo, 25 de Fevereiro, em que pelo menos 15 cristãos foram assassinados, as palavras de D. Kientega ajudam a compreender melhor o drama por que passam as comunidades que neste país de África estão sujeitas à violência dos grupos armados. “Não há liberdade de culto”, em muitas regiões do Burquina Fasso, esclarece o Bispo.
A situação chega a ser dramática para as populações. “Em algumas aldeias, [os terroristas] permitem que as pessoas rezem, mas proíbem o catecismo; noutros locais, dizem aos cristãos para não se reunirem na igreja para rezar, o que leva muitos a irem-se embora. Na minha diocese, duas paróquias estão fechadas porque os padres tiveram de partir, e outras duas estão bloqueadas, ninguém pode entrar ou sair”, descreve D. Justin Kientega.
CORAGEM FACE AO TERROR
Neste cenário, os cristãos sentem-se como que encurralados. Mas, como assinalou o Bispo, muitos têm manifestado uma coragem extraordinária face aos terroristas, face aos que aparecem de armas na mão querendo impor um Islão radical.
Alguns dos cristãos aceitam morrer. Muitos recusaram-se mesmo a tirar as cruzes que usam. Em alguns locais, as mulheres cristãs foram obrigadas a cobrir-se, mas recusam-se a converter-se ao Islão. Tentam sempre encontrar outras formas de viver a sua fé e de rezar.”
D. Justin Kientega
“Não é fácil”, repetiu por diversas vezes o bispo na conferência organizada pela Fundação AIS Internacional. A presença dos terroristas é tão intimidante que, nas aldeias bloqueadas, só o exército consegue furar o cerco para fazer chegar alimentos às populações e mais de duas centenas de escolas tiveram já de fechar portas, incluindo cerca de três dezenas pertencentes à Igreja.
Esta realidade levanta, obviamente, muitas questões sobre a origem destes grupos terroristas e quem os financia. “Perguntamos a nós próprios como é que isto aconteceu? Quem os está a apoiar? Quem os está a financiar? Alguns deles são burquinenses, nossos irmãos, e nem sequer cobrem a cara. Mas a questão é porquê? Porque é que estão a raptar e a matar pessoas? Porque é que vêm buscar os bens e os animais, queimam as aldeias?”
Perguntas que precisam de respostas urgentes e que sublinham a situação extremamente frágil em que se encontram os cristãos, uma das comunidades religiosas que mais tem sofrido com a presença dos jihadistas no Burquina Fasso e em toda a região do Sahel, em África.
IMPACTO CATASTRÓFICO
As palavras do Bispo de Ouahigouya reforçam o que a Fundação AIS publicou já em Junho do ano passado no mais recente Relatório sobre a Liberdade Religiosa no Mundo.
“O impacto sobre a população civil tem sido catastrófico”, pode ler-se no documento. “Mais de dois milhões de pessoas foram deslocadas, o que representa um aumento de mais de 7 mil por cento desde Agosto de 2018”, ou seja, uma das taxas que mais rapidamente cresceu no mundo, juntamente com Moçambique e a Ucrânia. “E mais de 1.000 escolas foram encerradas. Muitas crianças estão a ser recrutadas à força como crianças-soldado”, pelos militantes jihadistas, acrescenta ainda o relatório.
Tudo isto aponta para um cenário futuro que deverá continuar ensombrado pelo terror. “Apesar dos esforços dos líderes religiosos para reforçar a coesão social e a tolerância religiosa, os grupos jihadistas estão a avançar e a ganhar poder” diz o Relatório, concluindo que, “sem um envolvimento local e internacional significativo, as perspectivas de liberdade religiosa no Burquina Fasso a curto, e talvez a longo prazo, permanecem negativas”.
CAMPANHA EM PORTUGAL
Em resposta a todas estas ameaças, a Fundação AIS lançou em Portugal uma campanha de solidariedade que procura dar respostas nas áreas da alimentação, cuidados de saúde, educação e ainda apoio espiritual às populações mais atingidas pela violência.
Num destes projectos, o da “educação”, por exemplo, é possível ajudar uma criança que vive num campo de deslocados a ter acesso ao ensino por apenas 65 cêntimos por mês, ou seja, o valor, aproximadamente, de um café. O objectivo, neste caso, é o de se conseguir que pelo menos 100 crianças possam continuar a estudar, apesar da situação muito precária em que se encontram, em campos de acolhimento.
Mas as propostas da Fundação AIS vão para outras áreas também significativas e que fazem a diferença para estas populações que foram forçadas a fugir, que são vítimas da intolerância religiosa. É o caso da “alimentação”, em que com 481 euros por mês se pode auxiliar 26 famílias. Ou nos “cuidados de saúde”, em que, com 153 euros por mês, se pode dar assistência médica a 180 doentes…
Nesta Quaresma, o desafio é rezar por eles, por todos eles, e ajudá-los. A nossa oração e solidariedade podem fazer toda a diferença. O ataque terrorista a 25 de Fevereiro na capela de Essakane mostra como esta ajuda é mesmo urgente. Na conferência, o Bispo, D. Justian Kientega, agradeceu tudo o que a fundação pontifícia está a fazer pela Igreja do seu país. “Mas o mais importante”, diz, “é rezar para que o Senhor toque o coração destes terroristas. Rezamos todos os dias pela sua conversão. Isso é muito importante, que eles se convertam.”
Paulo Aido | Departamento de Informação da Fundação AIS | info@fundacao-ais.pt