Ontem, Domingo, o Papa Francisco manifestou-se triste e preocupado com a condenação a 26 anos de prisão do Bispo de Matagalpa, na Nicarágua, sentença que foi conhecida na sexta-feira, 10 de Fevereiro. No dia anterior, D. Rolando Álvarez recusou ser exilado, como o regime de Daniel Ortega pretendia. Agora ficará na prisão até 2049…
A condenação do Bispo de Matagalpa foi conhecida na sexta-feira, apenas um dia depois de mais de duas centenas de presos, entre os quais vários sacerdotes e seminaristas, acusados de “conspiração”, terem sido deportados para os Estados Unidos. Isso aconteceu na quinta-feira, dia 9. O Bispo de Matagalpa fazia parte dessa lista de pessoas a exilar, mas terá recusado abandonar o país e foi julgado logo no dia seguinte, apesar de o seu julgamento estar agendado apenas para a próxima quarta-feira, dia 15 de Fevereiro. Foi antecipado o julgamento e a condenação.
Ontem, Domingo, logo após a oração do Ângelus, o Papa Francisco falou deste caso e disse que estava triste e preocupado. “As notícias que chegam da Nicarágua entristeceram-me muito. Não posso deixar de recordar com preocupação o bispo de Matagalpa, D. Rolando Álvarez, de quem gosto muito, condenado a 26 anos de prisão e também as pessoas que foram deportadas para os EUA. Rezo por eles e por todos aqueles que sofrem naquela querida nação. E peço-vos vossas orações”, disse o Santo Padre. Na sentença proferida pelo Tribunal, D Álvarez, de 56 anos, foi referido como “traidor”, tendo sido condenado a ficar preso até 2049. O juiz considerou-o culpado de “conspiração para minar a integridade nacional e de propagação de falsas notícias através das tecnologias de informação e da comunicação em detrimento do Estado e da sociedade nicaraguense”.
Exílio nos Estados Unidos
A acusação das autoridades contra o Bispo de Matagalpa e administrador apostólico da Diocese de Estelí é bastante semelhante à que pendia sobre cinco sacerdotes, um diácono e dois seminaristas que deixaram o país na quinta-feira, rumo ao exílio nos Estados Unidos. Ao todo, foram expulsos do país 222 presos que o regime de Manágua considerou também como “traidores à pátria”, e que estariam a “minar a independência, soberania e autodeterminação do povo”, incitando “à violência, ao terrorismo e à desestabilização económica”.
Entre os que foram expulsos do país estão os padres Óscar Benavides, Ramiro Tijerino, Sadiel Eugarrios, José Díaz e Benito Martínez, e ainda o diácono Raúl Veja. Foram também deportados os seminaristas Melkin Centeno, Darvin Leyva, além de dois responsáveis pela comunicação social da Diocese de Matagalpa, identificados como Manuel Obando e Wilberto Astola.
Recusando o exílio, D. Rolando Álvarez, vai continuar nas cadeias do regime nicaraguense depois de ter sido preso na madrugada de 19 de Agosto do ano passado quando estava no paço episcopal. Antes disso, o governo de Daniel Ortega já tinha expulsado do país o Núncio Apostólico, Waldemar Stanislaw Sommertag, forçado a saída das Missionárias da Caridade, a congregação fundada pela Santa Madre Teresa de Calcutá, assim como de outros religiosos e sacerdotes, e provocado também o encerramento do canal de televisão da Conferência Episcopal e de outras seis estações de rádio católicas.
Centenas de ataques contra a Igreja
Ainda recentemente, em Novembro, foi publicada a edição actualizada do relatório “Nicarágua: uma Igreja perseguida?”, da responsabilidade da advogada e investigadora Martha Patricia Molina. Segundo esse relatório, houve, no período entre Abril de 2018 e Outubro de 2022, 396 ataques contra a Igreja Católica neste país da América do Sul.
Entre as quase quatro centenas de episódios documentados, há relatos de profanações, roubos, ameaças e discurso de ódio. Durante este período, foram vários os bispos, padres, irmãs e leigos visados pelas autoridades.
O trabalho de Martha Molina permite fazer um retrato pormenorizado do estado a que chegou a Nicarágua face ao abuso sistemático de direitos humanos. “Hoje , estudantes, camponeses, médicos, professores, padres, freiras, seminaristas, jornalistas, advogados, leigos da Igreja Católica e defensores dos direitos humanos são criminalizados pelo sistema de justiça do país e, como consequência, à data da publicação deste estudo, há 2194 prisioneiros políticos e milhares de cidadãos forçados ao exílio.”
A solidariedade da Fundação AIS
A prisão de D. Rolando Álvarez, em Agosto do ano passado, provocou de imediato um coro de críticas e de repúdio pela situação que se estava já a viver de atropelo às liberdades fundamentais na Nicarágua. Uma das reacções foi da Fundação AIS. Regina Lynch, directora de projectos internacionais da Ajuda à Igreja que Sofre, afirmou que se estava a assistir a “uma tentativa de silenciar a Igreja na Nicarágua”.
A Fundação AIS tem uma grande proximidade não só com a Igreja deste país do continente americano como também com o Bispo de Matagalpa, agora condenado a 26 anos de prisão. Prova disso, durante a sua última visita à sede internacional da AIS, em 2019, o Bispo Alvarez, fez questão de referir o trabalho conjunto que se vinha realizando há vários anos com o apoio da fundação pontifícia e de agradecer a ajuda dos benfeitores da instituição espalhados pelos quatro cantos do mundo.