MIANMAR: Associação luso-descendente fala em “barbárie” face à destruição de igreja católica

MIANMAR: Associação luso-descendente fala em “barbárie” face à destruição de igreja católica

A histórica Igreja de Nossa Senhora da Assunção no vilarejo de Chan-tha-ywa, onde vive uma comunidade católica, os bayingyis, descendentes de portugueses, foi totalmente incendiada e destruída no passado sábado, dia 14 de Janeiro, por soldados da junta militar, em mais um sinal de violência contra as minorias religiosas, nomeadamente os cristãos de Mianmar.

Joaquim Magalhães de Castro, director-geral para a região Ásia Pacífico da AILD, Associação Internacional de Lusodescendentes, lamenta, em declarações à Fundação AIS, “o silêncio” das autoridades face a mais um ataque contra um símbolo religioso e cultural em Mianmar, e fala mesmo em “barbárie”.

“A comunidade luso-descendente católica de Mianmar, os bayingyis, foi mais uma vez vítima de um ataque da junta militar”, afirmou ontem ao telefone, ao princípio da noite, este responsável que é também investigador da História da Expansão portuguesa.

“Desta feita foi uma igreja centenária totalmente incendiada. Aqui, em Portugal, continua o silêncio, apesar de todos os factos do que tem vindo a acontecer, dos ataques, das destruições das colheitas e das casas. Portugal continua a ignorar e, mais grave ainda, continua a não reconhecer a existência desta comunidade apesar de historicamente isso estar mais do que comprovado. É lamentável”, disse ainda este responsável.

 

LEVAR O ASSUNTO AO PARLAMENTO

Face à gravidade da situação, que a associação tem vindo a monitorizar, Joaquim Castro – autor também de diversos livros, nomeadamente “Viagem ao Tecto do Mundo”, que foi adaptado para documentário e exibido na televisão portuguesa –reafirma a necessidade de se fazer alguma coisa, até mesmo ao nível político, para se proteger esta comunidade católica, os bayingyis, descendentes de combatentes portugueses que entre os séculos XVI e XVII estiveram ao serviço dos monarcas birmaneses.

“Da parte da nossa associação a AILD, vamos tentar levar o assunto ao Parlamento e divulgar isto o mais possível a ver se se consegue fazer algo para travar esta barbárie”, disse à Fundação AIS.

 

O ATAQUE À IGREJA EM CHAN-THA-YWA

O ataque à histórica Igreja de Nossa Senhora da Assunção no vilarejo de Chan-tha-ywa foi realizado, segundo a agência de notícias AsiaNews, do Pontifício Instituto das Missões Estrangeiras da Igreja Católica, por “soldados que atacaram e incendiaram a igreja ‘sem razão aparente’, porque no local não houve nenhuma luta ou confronto, e também nenhuma provocação”.

Citando fontes locais sob anonimato, a AsiaNews escreve ainda que “os soldados estavam estacionados em frente à igreja desde a noite de 14 de janeiro e, antes de deixarem a área, realizaram a ‘atrocidade’, incendiando ‘completamente’ a igreja, a casa do pároco e o centenário convento das irmãs, que desmoronou depois de ser envolto em chamas”.

A Igreja, erguida no século XIX, em 1894, “era motivo de orgulho para os católicos do Alto Mianmar não apenas por causa de sua tradição secular, mas pelo baptismo do primeiro bispo [do país] e por ter sido sede da ordenação de três arcebispos e mais de 30 sacerdotes e religiosas”, pode ler-se no relato da AsiaNews. “O local de culto era de facto um património histórico e cultural para todo o país, incluindo os budistas, e prova disso é o clima de cooperação fraterna que foi estabelecido entre as diferentes comunidades.”

 

HISTÓRICO DE VIOLÊNCIA

Além da destruição do templo, há o relato ainda de que os soldados do governo terão ultrajado a sacralidade do local, “saqueando-o, bebendo álcool e fumando” no seu interior. Face a esta situação, “vários sacerdotes birmaneses fizeram apelos nas redes sociais para que rezem pelo país e pela própria comunidade cristã”, relata ainda a agência de noticias católica, sublinhando que “não houve” até ao momento, qualquer “tomada de posições ou declarações oficiais da Arquidiocese de Yangon e do Cardeal Charles Bo”.

Esta não é a primeira vez que a Associação Internacional de Lusodescendentes denuncia ataques contra as comunidades católicas em Mianmar. Em Julho do ano passado, e num comunicado enviado para a Fundação AIS em Lisboa, a AILD falava já numa “estratégia de terror adoptada pelos militares”, descrevendo ataques a algumas das 13 aldeias onde se concentram especialmente estas populações.

Uma das aldeias que já então estava na mira dos militares era Chan-tha-ywa. A 10 de Janeiro de 2022, “os soldados tomaram toda a aldeia, saqueando as habitações” e deixando um rasto de destruição e medo. “Abateram todo o tipo de animais domésticos, sustento das populações (vacas, búfalos, porcos, etc.), prenderam os poucos doentes e idosos que não puderam fugir, chegando a executar 3 habitantes, sem qualquer motivo.” Mais tarde, a 6 de Maio de 2022, “os soldados voltaram a Chan-tha-ywa, tendo incendiado 22 casas e destruído as respectivas colheitas”.

 

FUNDAÇÃO AIS LEMBRA “VÍTIMAS INOCENTES

A Fundação AIS tem vindo a acompanhar com preocupação a situação em Mianmar. A 1 de Fevereiro do ano passado, quando se assinalou o primeiro aniversário do golpe militar, a AIS convocou os seus benfeitores e amigos em todo o mundo para uma jornada de oração e de solidariedade para com a Igreja deste país asiático.

Na ocasião, Thomas Heine-Geldern, presidente executivo internacional da Fundação AIS, gravou uma mensagem desde Königstein, na Alemanha, explicando que a jornada de oração procurava ser “um sinal de solidariedade e de fraternidade” para com a Igreja local, lembrando todas as “vítimas inocentes” da violência que irrompeu neste país, desde que os militares tomaram conta do poder.

PA | Departamento de Informação da Fundação AIS | info@fundacao-ais.pt

Relatório da Liberdade Religiosa

Enquanto os direitos humanos, incluindo os direitos iguais das diversas comunidades étnicas e tradições religiosas de Mianmar, não forem respeitados, as perspectivas para a liberdade religiosa em Mianmar são terríveis. Espera-se que a perseguição continue e se intensifique, com mais atrocidades e crises humanitárias a chegar.

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