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SUDÃO SUL: “O país tem campos petrolíferos, mas os lucros não chegam ao povo”, denuncia Arcebispo de Juba
“Existem apenas algumas boas estradas… tudo é escasso. As pessoas buscam, de manhã à noite, por comida e água para beber. Este ano, a situação foi agravada por uma grande seca. Continuamos a debater-nos com os efeitos dos conflitos locais…” As palavras são de D. Stephen Ameyu Martin Mulla, Arcebispo de Juba, em entrevista à Fundação AIS. São palavras de denúncia, mas também de esperança de que melhores tempos virão para o mais jovem país do mundo que continua a ser, também, um dos mais pobres.
O futuro é incerto. Ao fim de dez anos de independência – assinalados no dia 9 de Julho – houve mais tempo em conflitos e guerras do que em paz. A crise humanitária é brutal. Os números, na sua frieza, dizem tudo. O Sudão do Sul é um dos países com a maior crise de deslocados e refugiados do continente africano. Actualmente, estão cerca de 2,2 milhões de sul-sudaneses refugiados em países da região, nomeadamente a Etiópia, Sudão e Uganda. Dentro de fronteiras, como deslocados internos, serão 1,6 milhões. Cerca de 60 por cento da população do país sofre, segundo as Nações Unidas, de “insegurança alimentar”.
Maldição da riqueza
D. Stephan Ameyu fala da “maldição “da riqueza quando se refere à pobreza extrema do povo. O Sudão do Sul tem vastos recursos naturais, mas a riqueza parece apenas beneficiar as elites. “Há alturas em que as riquezas provam ser uma maldição. O Sudão do Sul tem campos petrolíferos, mas os lucros não chegam até o povo. Foi iniciado um diálogo entre os bispos e o presidente e outras autoridades. Esperamos poder efectuar uma mudança de mentalidade através deste diálogo”, diz o Arcebispo.
O papel mediador da Igreja pode vir a revelar-se essencial. Os líderes do Sudão do Sul começaram como guerrilheiros. É preciso mudar a mentalidade. “Aqueles que detém responsabilidades estão gradualmente a perceber que não é do seu interesse continuar a agir de forma irresponsável. Como Igreja, podemos torná-los mais conscientes da sua responsabilidade. O presidente Salva Kiir Mayradit disse-nos que não tenciona regressar à guerra. Espero que nos tenha dito a verdade…”
Reconciliação e diálogo
Não voltar à guerra é essencial para haver paz no país, mas a verdadeira paz só se conquistará com reconciliação. Uma vez mais, a Igreja assume um papel chave no futuro do sudão do Sul. “Nós criamos departamentos separados para a justiça e paz em todas as dioceses. Tentamos educar as pessoas em unidade e colaboração”, explica o Arcebispo, acrescentando que o problema “é a mentalidade tribal, ou o tribalismo, que destruiu o nosso tecido social”. Por isso, disse ainda, “estamos a trabalhar arduamente para conseguir uma mudança no nosso povo através da reconciliação e do diálogo para ajudar o povo a entender que somos todos irmãos e irmãs”.
A unidade entre os Bispos do Sudão e os do Sudão do Sul é um modelo a seguir por todos. “Esta unidade”, diz D. Stephen, “permite juntar as nossas cabeças e as nossas ideias sobre como resolver os problemas mais prementes no Sudão e no Sudão do Sul. Estamos a tentar exercer pressão sobre os nossos governos. Eles têm de mudar a sua atitude em relação às pessoas.” A forma como os Bispos olham para os problemas do país, acima das querelas tribais e dos interesses de grupos, sempre na defesa apenas das populações, permite a D. Stephen dizer que “a Igreja é um sinal de paz e esperança para o povo do Sudão do Sul”.
“A fé é forte…”
Uma esperança que passa pela educação e saúde, duas das áreas em que a Igreja está mais empenhada. “A Igreja foi e é um líder nos sectores da educação e da saúde. Fazemos o nosso melhor para garantir que as pessoas tenham comida e água para beber. Tentamos encorajar as pessoas a cultivar para que possam cuidar de si mesmas. Estamos a ensinar as pessoas a serem confiantes e a defenderem os seus direitos…”
As palavras do prelado são mais do que uma carta de boas intenções. Traduzem a certeza de que o único caminho para a paz passa também pelo combate à pobreza, ao subdesenvolvimento. Nestes dez anos de independência dolorosa, a comunidade cristã tem passado também por muitas dificuldades. “Os cristãos sofrem muito. Os nossos padres também estão a passar por muitas dificuldades. Nas paróquias apenas existem choupanas, sem electricidade ou água… Nos lugares onde não há igrejas, as pessoas reúnem-se para rezar à sombra das árvores. Mas as pessoas chegam em grande número, a fé é forte…”
O futuro passa pela paz e pela educação. Na entrevista a André Stiefenhofer, D. Stephen agradece a ajuda que a Fundação AIS tem dado ao seu país. E pede para que essa ajuda continue. “Apelo urgentemente a um apoio contínuo no domínio da educação. A educação é da maior importância. O país encontra-se actualmente afectado por uma escassez alimentar severa. Até mesmo um pouco de ajuda financeira, por exemplo, para construir casas nas nossas paróquias. Agradeço à Ajuda à Igreja que Sofre por nos dar uma plataforma para falar sobre as nossas dificuldades e preocupações. Agradeço a todos os benfeitores pela sua ajuda!”
PA | Departamento de Informação da Fundação AIS | info@fundacao-ais.pt