Calcula-se que cerca de 100 mil pessoas já abandonaram o Sudão e mais de 300 mil estão deslocadas dentro do próprio país. A situação é muito inquietante, mas um missionário, contactado pela Fundação AIS Internacional, assegura que quer continuar por lá “até ao último minuto”. “Não quero deixar as pessoas aqui sozinhas…”, diz.
O Sudão está transformado num caos, com combates entre o exército, liderado pelo general Abdel Fattah al-Burhan, e as forças paramilitares de Apoio Rápido, do general Mohamed Hamdane Daglo, e isto apesar do cessar-fogo decidido entre os dois líderes rivais. Até ao momento, os combates já provocaram mais de 550 mortos e mais de 4.200 feridos e obrigaram milhares de sudaneses a procurarem abrigo em zonas eventualmente mais seguras ou em países da região, como o Sudão do Sul, o Egipto ou o Chade.
Neste cenário dramático, a Fundação AIS tem procurado entrar em contacto com responsáveis da Igreja. As informações disponíveis apontam para um agravamento da crise humanitária, com os campos de deslocados e de refugiados completamente cheios e as cidades cada vez com menos pessoas. Faltam alimentos, combustível, água. Mas a Igreja permanece junto das populações. “Quero ficar até ao último minuto. Não quero deixar as pessoas aqui sozinhas. Muitos dos nossos católicos vieram [à igreja]. Sabe, aqui, a Igreja é a esperança deles. Mas nós enfrentamos os mesmos problemas que o resto das pessoas”, afirmou a Maria Lozano e Kinga von Schierstaedt, respectivamente directora de comunicação e responsável de projectos da Fundação AIS, um missionário que, por questões de segurança não pode ser identificado.
Igreja bombardeada
Algumas Igrejas foram atingidas durante os combates, tal como edifícios públicos, incluindo hospitais. A Fundação AIS sabe que a igreja de Bahri, no norte de Cartum, foi atingida por uma bomba, mas os que se encontravam no local conseguiram apagar o fogo que chegou até ao telhado. Foi forçada também a entrada na catedral de Cartum e uma capela, pertencente a uma congregação religiosa, foi bombardeada. A nível humanitário, a questão da falta de água está a revelar-se dramática. As temperaturas são muito elevadas – chegam a atingir 40 graus à sombra… – e, na falta de alternativas, as pessoas arriscam ir até aos rios, mas essa água é imprópria para consumo o que poderá vir a ser um foco também de doenças. Parceiros de projectos da Fundação AIS explicam que falta em todo o lado tudo o que é essencial. Os mercados estão vazios, os alimentos são escassos, o combustível rareia e formam-se, por vezes, longas filas nas estações de serviço.
Risco de conflito regional
Na passada quarta-feira, dia 3 de Maio, o secretário-geral da ONU manifestou a sua preocupação pelo risco de esta crise poder alastrar para fora das fronteiras do próprio Sudão. Um dos países para onde mais pessoas têm fugido é o Chade, e António Guterres sublinha isso. “É absolutamente essencial prestar um apoio maciço ao Chade na situação actual. Por outro lado, temos outros países da região que estão a realizar os seus próprios processos de paz. A Etiópia está num processo de paz (após dois anos de guerra em Tigray). É absolutamente essencial evitar que [a guerra do] Sudão se propague para a Etiópia”, afirmou, acrescentando que “o Sudão do Sul está a passar [também] por um processo lento e difícil para implementar os acordos que foram alcançados”. “Qualquer perturbação no Sudão do Sul seria extremamente perigosa…” Por tudo isto, o secretário-geral da ONU, que falava em Nairobi, a capital do Quénia, diz que “a situação actual é totalmente inaceitável” e que “tem de haver um cessar-fogo duradouro”.