D. Rolando Álvarez vai mesmo ser julgado. Esta é a principal conclusão da audiência preliminar de terça-feira, 10 de Janeiro. O Tribunal de Manágua decidiu também manter o Bispo de Matagalpa em prisão domiciliária.
Não foi ainda divulgada a data do início do julgamento em que o prelado vai responder pela acusação de “conspiração” contra a integridade nacional e de “propagação de falsas notícias”, através das tecnologias de informação e comunicação “em detrimento do Estado e da sociedade nicaraguense”.
Na audiência de terça-feira, foi confirmado também o mandado de captura contra o Padre Uriel Antonio Vallejos, responsável pela paróquia de Jesus da Divina Misericórdia, na cidade de Sébaco, que enfrenta as mesmas acusações que o bispo e que está fora do país.
Esta audiência ocorre depois de a 13 de Dezembro, o tribunal ter admitido as acusações formuladas pelo procurador do Ministério Público contra D. Rolando Álvarez, de 56 anos, Bispo da Diocese de Matagalpa e também Administrador Apostólico da Diocese de Estelí, e que é o primeiro prelado a ser preso e processado desde 2007, quando Daniel Ortega regressou ao poder.
Juntamente com D. Álvarez, foram detidos por agentes da polícia seis sacerdotes, seminaristas e leigos que se encontravam com o bispo na madrugada de 19 de Agosto no palácio episcopal.
A Diocese de Matagalpa pediu entretanto aos fiéis para rezarem por D. Rolando Álvarez que é, neste momento, um dos rostos mais visíveis da perseguição à Igreja pelo regime de Ortega.
Antes de o Bispo ter sido colocado em prisão domiciliária, o governo de Daniel Ortega expulsava o Núncio Apostólico, Waldemar Stanislaw Sommertag, forçava a saída do país das Missionárias da Caridade, a congregação fundada pela Santa Madre Teresa de Calcutá, assim como de outros religiosos e sacerdotes, e provocava também o encerramento do canal de televisão da Conferência Episcopal e de outras seis estações de rádio católicas.
Ainda recentemente, em Novembro, foi publicada a edição actualizada do relatório “Nicarágua: uma Igreja perseguida?”, da responsabilidade da advogada e investigadora Martha Patricia Molina. Segundo esse relatório, houve, no período entre Abril de 2018 e Outubro de 2022, 396 ataques contra a Igreja Católica neste país da América do Sul.
Entre as quase quatro centenas de episódios documentados, há relatos de profanações, roubos, ameaças e discurso de ódio. Durante este período, foram vários os bispos, padres, irmãs e leigos visados pelas autoridades.
O trabalho de Martha Molina permite fazer um retrato pormenorizado do estado a que chegou a Nicarágua face ao abuso sistemático de direitos humanos. “Hoje , estudantes, camponeses, médicos, professores, padres, freiras, seminaristas, jornalistas, advogados, leigos da Igreja Católica e defensores dos direitos humanos são criminalizados pelo sistema de justiça do país e, como consequência, à data da publicação deste estudo, há 2194 prisioneiros políticos e milhares de cidadãos forçados ao exílio.”
A prisão de D. Rolando Álvarez provocou inúmeras reacções. Desde o Papa Francisco, até às Conferências Episcopais de Cuba, Itália e Brasil, passando pelo secretário-geral da ONU e o Parlamento Europeu, foram muitas já as vozes que se ergueram já em defesa do Bispo e de repúdio pela situação em que se encontra.
Também a Fundação AIS já expressou publicamente a sua condenação pela forma como as autoridades nicaraguenses estão a agir. Regina Lynch, directora de projectos internacionais da Fundação AIS, afirmou, logo após a detenção de D. Rolando, que se está a assistir a “uma tentativa de silenciar a Igreja na Nicarágua”. E acrescentou que não há uma solução fácil para esta situação. “Precisamos de apoiá-los tanto quanto possível. Temos de rezar para que possa haver uma solução pacífica e não um aumento adicional das hostilidades”, acrescentou ainda a responsável da Ajuda à Igreja que Sofre.
A Fundação AIS tem uma grande proximidade não só com a Igreja nicaraguense como também com o Bispo de Matagalpa, agora detido.
Prova disso, durante a sua última visita à sede internacional da AIS, em 2019, o Bispo Alvarez, fez questão de referir o trabalho conjunto que se vem realizando há vários anos com o apoio da fundação pontifícia e de agradecer a ajuda dos benfeitores da instituição espalhados pelos quatro cantos do mundo.