Os cristãos da Síria estão a sentir uma grande dor. A comunidade cristã está a viver um momento de grande tristeza, com a morte de 30 cristãos no atentado de Domingo, dia 22, na Igreja de Santo Elias, em Damasco e que causou também mais de meia centena de feridos. Em entrevista à Fundação AIS, o padre franciscano Fadi Azar deixa um sentido desabafo: “Sentimos que estamos sozinhos”.
O atentado terrorista na Igreja de Santo Elias, na cidade de Damasco, no Domingo, 22 de Junho, e que causou a morte a 30 fiéis e mais de 50 feridos, continua a marcar a vida da comunidade cristã na Síria, com apelos à segurança e protecção dos fiéis.
O Padre Fadi Azar diz, em entrevista à Fundação AIS, que a situação está mesmo a tornar-se cada vez mais complicada no país para alguns grupos religiosos. “Mas sempre que a Igreja fala com o governo, dizem que se trata de um caso isolado. Até agora, até este momento grave que ‘tocou’ toda a Síria.” O sacerdote deixou um apelo à defesa dos direitos humanos na Síria. “Temos fé, não temos medo. A perseguição aos cristãos no Médio Oriente, na Terra Santa, sempre existiu. Há 2 mil anos que existe perseguição. Mas nós estamos neste mundo, onde os direitos humanos são defendidos. Nós só queremos justiça, justiça, nada mais. Os cristãos têm o direito de viver num país onde haja segurança, para poderem ir à igreja rezar em paz”, afirma.
O padre, que vive em Latakia, mas que passou muitos anos em Damasco, fala também da incerteza destes tempos e do sofrimento dos cristãos após o atentado de Domingo, dia 22 de Junho. E sublinha que têm ocorrido outros ataques, “por exemplo, tiroteios em frente a igrejas em Homs e Hama, bem como raptos”. “Muitos cristãos estão a perder os seus empregos”, relata ainda.
“ISTO É UMA PERSEGUIÇÃO…”
Sobre a situação de instabilidade no país desde a queda do regime e mudança de governo, em Dezembro passado, o sacerdote franciscano recorda o que aconteceu já em Março. “Nesse mês, aqui em Latakia, mataram muitos alauitas”, referindo-se às aldeias a leste de Latakia, na região costeira do país, e que foram palco de violentos massacres contra esta comunidade religiosa.
E agora, acrescenta, “houve um atentado deste tipo: [terroristas] entram numa igreja e matam muitas pessoas durante a missa, durante a oração, num domingo às seis da tarde”. O padre insiste que, neste cenário, os cristãos não são os únicos que têm medo: “os alauítas, os drusos… isto é uma perseguição”.
Quanto aos alegados autores do ataque à igreja de Dweila, em Damasco, há diferentes versões sobre a sua identidade. “Alguém disse que foi o grupo Ansar al-Sunna, que carrega a bandeira do Daesh. Antes, estavam todos em Idlib.” E enfatiza. “É um perigo, não só para os cristãos, mas também para os drusos ou alauítas, e mesmo para os muçulmanos moderados…. São muito perigosos (…). Eles não querem um governo civil, querem um governo terrorista islâmico fanático”.
JÁ SE ESPERAVA ALGUM INCIDENTE
Quanto ao facto de o ataque ter sido inesperado para a população, o padre diz que, de certa forma, já se esperava algo do género há alguns meses. “Havia ameaças, muitas ameaças. Era esperado, mas não se sabia quando (…). Na semana passada, já tinham atacado uma igreja em Homs, a igreja ortodoxa síria, onde um rapaz disparou contra a porta da igreja”, recorda.
De acordo com os meios de comunicação social locais, na quinta-feira passada, 26 de Junho, ocorreu um outro ataque quando indivíduos que se faziam transportar em motorizadas abriram fogo em frente à igreja em Latakia e, tragicamente, uma pessoa morreu. A Diocese Ortodoxa Grega de Latakia negou informações que apontavam para a morte do guarda da igreja, assegurando que a vítima não tem ligações directas à igreja e que o ataque ocorreu no exterior do edifício.
PEDIDO DE AJUDA INTERNACIONAL
Sobre a forma como a comunidade cristã local se está a sentir neste momento, o padre franciscano diz que “todos os cristãos estão a sofrer muito”. “Sentimo-nos sozinhos agora. Pedimos a intervenção do Vaticano, da Comunidade Europeia…” E continua: “As pessoas estão agora a dizer-nos: ‘Padre, não queremos ajuda, não queremos comida, medicamentos, nada. Ajude-nos é a fugir. Não podemos viver aqui. Tememos pelas nossas vidas, tememos pelo futuro dos nossos filhos’”.
Neste contexto, o número de cristãos na Síria continua a diminuir. “Somos agora uma minoria. Em todos estes anos, antes da guerra, havia 10% de cristãos, agora somos 3%. E provavelmente este Verão, muitos cristãos vão partir”, afirma ainda à Fundação AIS.
“ESTOU PERTO DE VOCÊS” – Leão XIV
A situação na Síria, após o atentado em Damasco tem merecido também a atenção do Papa Leão XIV. Durante a audiência geral das quartas-feiras, dia 25, o Santo Padre referiu-se ao “vil atentado terrorista”, assegurando as orações de todos pelos “feridos e seus familiares” e entregando “as vítimas à misericórdia de Deus”.
Na mensagem, o Papa reafirma também a proximidade da Igreja para com os cristãos do Médio Oriente, apelando à vigilância da comunidade internacional.
Estou perto de vocês, toda a Igreja está perto de vocês. Esse trágico acontecimento lembra a profunda fragilidade que ainda marca a Síria, após anos de conflitos e instabilidade. É, portanto, fundamental que a comunidade internacional não desvie o olhar deste país, mas continue a oferecer-lhe apoio através de gestos de solidariedade e com um renovado compromisso pela paz e a reconciliação.”
Papa Leão XIV
APELO ÀS ORAÇÕES DOS PORTUGUESES
Logo após o atentado, a Irmã Maria Lúcia Ferreira, a única religiosa portuguesa a viver na Síria, enviou uma mensagem para a Fundação AIS em Lisboa a pedir as orações de todos pelo país e pela comunidade.
“Os cristãos da Síria pedem o vosso apoio urgente com a oração e com aquilo que puderem fazer. Venham em auxílio dos cristãos da Síria, um dos últimos bastiões da cristandade no Médio Oriente, que guardam as raízes do cristianismo”, disse a Irmã Myri, como é normalmente conhecida esta religiosa que pertence à Congregação das Monjas de Unidade de Antioquia e vive no Mosteiro de São Tiago Mutilado, na vila de Qara.
Blanca Tortosa e Paulo Aido
Departamento de Informação da Fundação AIS | info@fundacao-ais.pt