HAITI: “Temos de vencer o medo e dar lugar à esperança”

Assolado há meses por gangues que saqueiam, raptam e aterrorizam a população, o Haiti continua a lutar todos os dias pela sua sobrevivência. No meio desta terrível situação, a Igreja no país continua a ser um farol de esperança, afirma o Pe. Baudelaire Martial, sacerdote haitiano da Congregação da Santa Cruz, que visitou a sede internacional da Fundação AIS, na Alemanha, e concedeu-nos uma entrevista.

Acredita que a situação poderá melhorar com a recente chegada de um contingente de polícias quenianos com o apoio da ONU?

Sim, temos esperança de que as autoridades quenianas nos ajudem a recuperar. Agora são os gangues que começam a ter medo e vimo-los a tentar negociar. Há alguns dias que a situação está mais calma. No entanto, pedimos mais do que uma calma aparente: exigimos a libertação de Port-au-Prince e de todos os lugares mais remotos do Haiti, para que possamos viver como dantes. Há dias, o Estado recuperou o controlo do Grande Hospital Central de Port-au-Prince, o que é um sinal promissor.

Muitos religiosos foram raptados nos últimos anos. A Igreja, em particular, é vista como um alvo para estes gangues?

Tenho a impressão de que há uma campanha organizada contra a Igreja, porque vimos muitos padres e religiosos serem vítimas desses gangues. Na minha comunidade, um padre foi raptado e tivemos de pagar um resgate para o libertar. Muitas dioceses e comunidades foram vítimas de roubo e agressão. É assim que pressionam a Igreja a silenciar-se, mas a nossa missão profética exige que chamemos a atenção para o mal. Sabemos que esta é uma posição arriscada, mas essa é a nossa cruz e nós aceitamo-la. Como Igreja, temos de ter a fé e a força para acompanhar as pessoas e todos aqueles que sofrem, e continuaremos a fazê-lo, mesmo arriscando a vida.

Qual é a situação das crianças e dos jovens?

Os jovens vivem o terror quotidiano. No Foyer de l’Esperance – um centro social que dirijo para os jovens – uma menina de 12 anos foi assassinada e outra foi violentamente atacada. Várias escolas estão encerradas. Felizmente, graças a tudo o que foi posto em prática durante a pandemia, algumas escolas estão preparadas para ensinar online. Terminámos este ano lectivo o melhor que pudemos e esperamos que a situação melhore antes do início do próximo ano. 

É seguro para os fiéis irem à Missa em Port-au-Prince?

Muitas paróquias estão fechadas. Algumas delas, como a catedral, estão em zonas de conflito. Este ano, por exemplo, a Missa Crismal foi celebrada na Igreja de Nossa Senhora da Altagracia, em Delmas, em vez de ser celebrada na catedral. Outras zonas são mais acessíveis e, por isso, os fiéis começaram a reunir-se nas paróquias que estão abertas. Passámos também a oferecer apoio pastoral online. A fé das pessoas continua viva. A Missa de Quinta-feira Santa, por exemplo, foi muito concorrida, apesar do perigo.

Como é que se consegue ter esperança para continuar todos os dias?

Perante todas estas dificuldades, enquanto pastores do nosso povo, procuramos manter viva a esperança, apesar de tudo. Felizmente, a Igreja está lá para apoiar as pessoas. Algumas pessoas estão traumatizadas, sofreram ferimentos graves ou abusos, mas, com o passar do tempo, o choque diminui. O medo permanece, mas, enquanto Igreja, não nos podemos render, temos de continuar a avançar e a dar esperança.

Qual é o seu papel em tudo isto, como padre?

Como padre, o meu papel é dar testemunho. Esta crise é também uma oportunidade para amar e apoiar, especialmente aqueles que estão a enfrentar dificuldades e os necessitados. Porque é nossa responsabilidade acompanhá-los e ajudá-los a recuperar a esperança. Sou director do CIFOR (Centro Interinstitucional de Formação Religiosa) há 15 anos. É aí que, com o apoio da Fundação AIS, proporcionamos aos seminaristas uma formação intelectual, espiritual e humana.

Tem alguma mensagem especial para os benfeitores que apoiam o Haiti?

Gostaria de agradecer aos benfeitores da Fundação AIS porque, graças à vossa ajuda, a Igreja do Haiti pode continuar a desempenhar o seu papel profético. Obrigado, do fundo do coração, porque sem a Fundação AIS, a calamidade no Haiti seria ainda pior, e sem o apoio da Fundação AIS, a situação dos seminaristas seria ainda mais negra. Muito, muito obrigado!

Em 2023, a Fundação AIS apoiou a Igreja no Haiti com 55 projectos avaliados em 828.000 €. No actual contexto de crise generalizada, entre estes projectos, a Fundação AIS tem financiado a formação de futuros sacerdotes, ajudando as ordens religiosas femininas com ajudas de subsistência e os sacerdotes com estipêndios de Missa. Há muitos anos que a Fundação AIS apoia os programas de formação do CIFOR, proporcionando aos jovens religiosos e religiosas uma formação adaptada às necessidades da vida consagrada.

Amélie Berthelin | Departamento de Informação da Fundação AIS | info@fundacao-ais.pt

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Relatório da Liberdade Religiosa

O Haiti está à deriva em direcção a tornar-se um Estado falhado. A crise política e económica alimentou um aumento da violência dos gangues territoriais, provocando uma crise social e humanitária catastrófica. Os raptos para exigir resgate, incluindo do clero, e os assassínios relacionados com gangues aumentaram exponencialmente. A insegurança generalizada do país tem afectado todos os direitos fundamentais, incluindo a liberdade religiosa.

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