SÍRIA: “Vamos ficar como a Venezuela”, diz religiosa portuguesa, que vive em Qara, ao fim de 10 anos de guerra

SÍRIA: “Vamos ficar como a Venezuela”, diz religiosa portuguesa, que vive em Qara, ao fim de 10 anos de guerra

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SÍRIA: “Vamos ficar como a Venezuela”, diz religiosa portuguesa, que vive em Qara, ao fim de 10 anos de guerra

Segunda-feira · 15 Março, 2021

“Vamos ficar como a Venezuela. É a mesma coisa…” A Irmã Maria Lúcia Ferreira, uma religiosa portuguesa que pertence à Congregação das Monjas de Unidade de Antioquia, manifesta assim o seu cepticismo face às dificuldades que os cidadãos enfrentam no dia-a-dia na Síria no dia em que se assinalam dez anos de guerra.

A infeliz data de 15 de Março de 2011 marcou de facto o início de um tormento que parece não ter fim e que continua a afectar profundamente a vida de milhões de pessoas. A começar no acesso a bens de primeira necessidade, como o pão. A religiosa, que é mais conhecida como Irmã Myri, e que vive no Mosteiro de São Tiago Mutilado, na vila de Qara, descreve, numa mensagem enviada para a Fundação AIS em Lisboa, uma realidade que começa a ser angustiante para muitas famílias.

“Começa a faltar o pão. Há muita gente que sobrevivia porque o governo tabelou o preço muito baixo para que todos pudessem ao menos comer pão. O preço continua baixo, relativamente baixo, mas o pior é que começa a não haver para todos. É preciso esperar quatro dias para se ter um saco de pão que tem oito pães achatados. Ora, uma grande família não pode subsistir assim….”

SÍRIA: “Vamos ficar como a Venezuela”, diz religiosa portuguesa, que vive em Qara, ao fim de 10 anos de guerra
“Vamos ficar como a Venezuela. É a mesma coisa…”

A capital da Síria, explica a religiosa que nasceu numa aldeia do Patriarcado de Lisboa, é exemplo desta realidade. “Em Damasco, ouve-se dizer, é preciso estar na fila durante horas e o pão é racionado por famílias, um tanto para cada família, dependendo do número de pessoas, e às vezes passa-se três, quatro dias, sem se ter pão, sem receber pão…”

A somar a isto, continua a verificar-se um pouco por todo o país falhas também no fornecimento de electricidade. Principalmente durante as horas do dia. O mesmo acontece com os combustíveis, como o mazut [para o aquecimento] e a gasolina. Tem havido muito pouco. É muito racionado. Também é muito difícil encontrar gás para cozinhar, é racionado e é dado às famílias um tanto a cada mês ou a cada dois meses.”

Mas o pior de tudo, nesta descrição sobre o quotidiano dos sírios num país que permanece guerra há uma década, é o aumento do custo de vida. Um aumento que a Irmã Myri considera ser consequência também da pandemia do coronavírus mas, essencialmente, das sanções económicas impostas ao regime de Bashar al-Assad pelos Estados Unidos da América e União europeia. “O pior de tudo são os preços que aumentam, aumentam, aumentam… Uma das grandes culpas é a situação do Covid 19 [que afecta] o mundo inteiro, a segunda grande culpa é das sanções económicas à Síria. Sanções criminosas para o povo que não afectam tanto o governo quanto o povo. É o povo que paga.”

Neste país com marcas profundas da destruição causada pela guerra e com a economia paralisada pelas sanções económicas, começa a florescer o chamado ‘mercado negro’. A religiosa portuguesa fala nas dificuldades do governo em enfrentar esta realidade e afirma que a população começa a sentir que o país está a encaminhar-se para o pesadelo em que se transformou a Venezuela. “O mercado negro do dólar dentro do país… é uma grande dificuldade. E mesmo se o governo tem tentado resolver isso é muito difícil, pois se coloca alguns na prisão, outros aparecem, e as pessoas já dizem que nós vamos ficar como a Venezuela. É a mesma coisa.”

Os dez anos de guerra na Síria foram lembrados ontem, domingo, pelo Papa Francisco. No final da oração mariana do Angelus, o Santo Padre recordou que foi em 15 de Março de 2011 que “começou o sangrento conflito na Síria, que causou uma das maiores catástrofes humanitárias de nosso tempo: um número não especificado de mortos e feridos, milhões de refugiados, milhares de desaparecidos, destruição, violência de todos os tipos e imenso sofrimento para toda a população, especialmente os mais vulneráveis, como crianças, mulheres e idosos”. E uma vez mais o Papa fez erguer a sua voz pedindo o fim da guerra, pedindo sinais de boa vontade, pedindo compromissos à comunidade internacional para ajudar à recuperação económica deste país dilacerado e para ajudar à sua reconstrução.

“Renovo o meu premente apelo às partes em conflito para que manifestem sinais de boa vontade, de modo que se possa abrir um sinal de esperança para a população que sofre. Também espero um compromisso decisivo e renovado, construtivo e solidário por parte da comunidade internacional, para que, uma vez depostas as armas, a situação social possa ser melhorada e que seja encaminhada a reconstrução e a recuperação econômica”, disse o Santo Padre.

A situação grave que se vive na Síria, e que a religiosa portuguesa expressou nesta mensagem, levou o Presidente executivo internacional da Fundação AIS a apelar aos Estados Unidos e à União Europeia para facilitarem o acesso da ajuda humanitária de emergência a este país. Um acesso que está comprometido por causa dos obstáculos criados pelas sanções impostas ao regime de Damasco.

Desde Março de 2011, a comunidade cristã tem sido das mais afectadas pela guerra neste país. Graças à generosidade dos benfeitores da Fundação AIS em Portugal e em todo o mundo já foram doados quase 42 milhões de euros para mais de 900 projectos humanitários e pastorais da Igreja na Síria.

PA | Departamento de Informação da Fundação AIS | info@fundacao-ais.pt

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