A Fundação AIS manifesta a sua profunda preocupação com a escalada de violência na Síria, particularmente na região costeira, onde centenas de civis foram vítimas de ataques indiscriminados. A situação criou uma atmosfera de medo e incerteza, também para as comunidades cristãs, que já sofreram muito na última década. Sinal disso, a Irmã Myri, a única religiosa portuguesa a viver na Síria, enviou uma mensagem para a Fundação AIS em Lisboa a pedir as orações dos portugueses por causa do que se passa no país…
Segundo fontes de Latakia próximas da organização, que a Fundação AIS prefere manter no anonimato por razões de segurança, a passada sexta-feira foi descrita como “um dia muito negro e doloroso” nas cidades de Tartus, Banias, Jabla e Latakia, bem como nas aldeias circundantes. A fonte relatou: “Massacres contra muitos alauítas, muitas vezes de forma indiscriminada, em resposta a uma emboscada efectuada por alguns militantes alauítas que matou cerca de 20 membros das novas forças de segurança”. A mesma fonte afirmou: “O número de vítimas é muito triste; a maioria eram civis, mais de 600, que perderam a vida, incluindo jovens, mulheres, médicos universitários e farmacêuticos. Algumas famílias com os seus filhos foram mortas a sangue-frio”.
Entre os mortos encontram-se também membros de comunidades cristãs, como “um pai e um filho pertencentes a uma igreja evangélica em Latakia, que foram mandados parar quando viajavam de carro e mortos, bem como o pai de um sacerdote em Banias”.
CASAS CRISTÃS SAQUEADAS
Além disso, os relatos indicam que casas e veículos foram saqueados, afectando todos, mas também os Cristãos, obrigando algumas famílias a refugiar-se em casas de amigos sunitas. Na aldeia cristã de Belma, “onde não há armas e a maioria dos residentes são idosos, a população viveu dois dias de terror, as casas foram invadidas e os bens roubados”.
Entretanto, o Vicariato Apostólico da Comunidade Latina na Síria emitiu um comunicado em que expressa a sua profunda preocupação por estes ataques a civis inocentes. No documento, assinado por D. Hanna e datado de 9 de Março de 2025, afirma-se: “Unimo-nos à voz de todas as pessoas honestas e patrióticas deste país, sublinhando a nossa rejeição de todas as formas de violência, vingança e retaliação baseadas em motivos sectários e religiosos. Apelamos às autoridades do país para que ponham rapidamente termo a estes ataques, que são incompatíveis com todos os valores humanos, morais e religiosos”.
O comunicado menciona igualmente a promessa do presidente Ahmed Al-Sharaa de responsabilizar aqueles que atacam civis e de implementar “as transições necessárias para conduzir o país à segurança”. Além disso, reitera o compromisso com a unidade territorial da Síria e rejeita qualquer tentativa de dividir o país.
“TRÁGICOS ACONTECIMENTOS”
Na homilia do Domingo da Ortodoxia, proferida a 9 de Março de 2025, na Catedral Mariamita de Damasco, o Patriarca João X abordou também a violência na região costeira e lançou um apelo urgente ao presidente Al-Sharaa: “Os trágicos acontecimentos que se desenrolam na região costeira da Síria custaram a vida a muitos civis e aos elementos da segurança pública, deixando muitos outros feridos. No entanto, a maioria das vítimas não pertencia a nenhuma facção militante, mas eram civis inocentes e desarmados, incluindo mulheres e crianças. A dignidade e a sacralidade do povo foram pisadas e os slogans e cânticos utilizados estão a espalhar a divisão, a alimentar o sectarismo e a minar a paz civil”.
Referiu-se às pilhagens e à violência em Banias, no bairro de Al-Qusour, onde “os residentes foram obrigados a abandonar as suas casas para serem executados e depois os seus pertences foram roubados”. O prelado denunciou também a profanação de símbolos religiosos, declarando: “O ícone da Virgem Maria foi esmagado, espezinhado e profanado. Ela é a Virgem Maria, que todos os Muçulmanos honram juntamente connosco, e a quem o Sagrado Alcorão dedicou um capítulo inteiro – Surah Maryam – afirmando que Deus a escolheu e a tornou a mais honrada entre todas as mulheres do mundo”.
Dirigindo-se ao presidente Al-Sharaa, o Patriarca apelou ao restabelecimento da segurança e da estabilidade para todos os Sírios sem distinção, reafirmando a sua rejeição do sectarismo e apelando à unidade nacional e à coexistência pacífica.
APELO DA PRESIDENTE DA AIS
Para além desta crise, a comunidade cristã, juntamente com o resto da população na Síria, enfrenta uma incerteza crescente após a tomada do poder pelo Hay’at Tahrir al-Sham (HTS), o que intensificou ainda mais a sua vulnerabilidade em várias regiões do país. À luz desta tragédia, Regina Lynch, presidente executiva da Fundação AIS, lançou um apelo à oração:
Nestes momentos de dor e sofrimento, voltamo-nos para a única fonte verdadeira de paz: a oração. Pedimos a todos os fiéis que elevem a sua voz ao Senhor, confiando no Seu amor e poder para levar conforto àqueles que mais precisam. Que Nossa Senhora da Síria proteja o seu povo, que sofreu demasiadas feridas ao longo da última década. Agora, mais do que nunca, devemos rezar pela sua cura e pelo seu futuro. Que a fé nos mantenha unidos e que a esperança em Cristo ilumine esta nação sofredora.
MENSAGEM DA RELIGIOSA PORTUGUESA
Entretanto, também a Irmã Maria Lúcia Ferreira, a única religiosa portuguesa na Síria, também conhecida como Irmã Myri, e que pertence à congregação das Monjas de Unidade de Antioquia, enviou uma mensagem para a Fundação AIS em Lisboa com um pedido por orações.
“Peço-vos que rezem pelos cristãos da Síria, através da Fundação Ajuda à Igreja que Sofre. Rezem por esta igreja que sofre e que pode vir a sofrer muito mais. Que o Senhor tenha piedade de nós”, diz a religiosa que vive no Mosteiro de São Tiago Mutilado, na vila de Qara. “Os cristãos daqui, desta região que é a Terra Santa, esperam pelas vossas orações, esperam que os irmãos do Ocidente venham em seu auxílio. Peço-vos que estejam próximos destes cristãos, destes irmãos”, acrescenta a irmã, finalizando a sua curta mensagem com o desejo de que a Síria possa ser “um país onde todos tenham lugar, incluindo os cristãos, onde cada confissão religiosa possa continuar a ser o que tem sido durante séculos”.
A situação na Síria também preocupa o Santo Padre. No texto preparado por Francisco para o Angelus do passado domingo, 9 de Março, e que foi divulgado pela sala da imprensa da Santa Sé, o Papa refere o regresso da violência no país e pede respeito por todos, independentemente da sua filiação étnica ou religiosa. “Em particular, tomei conhecimento com preocupação do recomeço de violências nalgumas zonas da Síria: espero que cessem definitivamente, no pleno respeito de todas as componentes étnicas e religiosas da sociedade, especialmente dos civis”, escreveu o Papa que também pediu o dom da paz para a “martirizada Ucrânia”, para a Palestina, Israel, Líbano, Mianmar, Sudão e República Democrática do Congo.
Maria Lozano e Paulo Aido
Departamento de Informação da Fundação AIS | info@fundacao-ais.pt