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PAQUISTÃO: Comunidade cristã assiste em lágrimas à demolição da Igreja de São José e de centenas de casas em Karachi
“Enquanto demoliam a nossa igreja, todos chorávamos!” Fouzia Bibi assistiu, impotente, ao momento em que os buldózeres derrubaram as paredes da Igreja de São José, cumprindo assim com um polémico plano das autoridades locais de limpeza de uma vasta área urbana de Karachi que tem estado sujeita a fortes inundações. “Não podíamos detê-los”, acrescenta esta mulher cristã. “Havia muitos polícias que formavam uma barreira para suster a multidão que queria impedir a demolição.”
Para a concretização do plano de limpeza do espaço urbano, caracterizado por inúmeras construções precárias e de génese clandestina, as autoridades têm vindo a proceder à demolição de centenas de habitações mas também de lugares de culto, nomeadamente templos cristãos pertencentes à Igreja Evangélica.
“As escavadoras derrubaram as paredes e os pilares e o telhado desabou por falta de sustentação”, explicou Fouzia Bibi à agência de notícias Asia News. Apesar de a Igreja de São José ter sido derrubada a 25 de Agosto, os fiéis não deixaram de continuar a usar o espaço para momentos de oração. No primeiro domingo de Setembro, por exemplo, e ainda segundo Fouzia Bibi, a comunidade cristã esteve reunida e celebrou até a Santa Missa. “Celebrámos a missa entre os escombros da igreja demolida. Graças à equipa local da Caritas, que forneceu lonas e materiais para cobrir parte da igreja…”
A Fundação AIS já alertou, em Abril, para as consequências dramáticas que podem advir deste complexo processo de limpeza do espaço urbano em Karachi, no Paquistão. Então, tinham sido já demolidas as casas de cerca de 450 famílias cristãs em Hyderabad por ordem do governo provincial de Sindh, por alegadamente serem construções clandestinas e pela necessidade de limpeza de cursos de água existentes na região.
A decisão de limpeza da área urbana foi tomada no ano passado após terem ocorrido fortes inundações no espaço urbano. Caso avance na totalidade este plano, calcula-se que poderão vir a ser demolidas cerca de 14 mil habitações e 3 mil lojas.
Anum Arif, uma voluntária da Caritas em Karachi, explicou à Fundação AIS que há centenas de famílias cristãs que habitam em bairros de lata nesta região. As casas começaram entretanto a ser assinaladas consoante a localização em que se encontram e se estão, ou não, incluídas no processo de demolição.
O tribunal ordenou que fosse dada uma compensação às famílias que vão perder as suas habitações, mas esta é também uma questão sensível. “O meu avô emigrou da província de Punjab e comprou 15 mil pés quadrados de terra a apenas 30 pés do rio. Outros parentes também possuem várias casas”, explica Anum Arif.
“As casas estão marcadas com a percentagem de demolição que vai ser realizada. Os que têm as suas casas marcadas com 100% têm de as desocupar em sete dias. A nossa casa está marcada com 85%. Todos nós temos os documentos do arrendamento, mas o governo de Sindh recusa-se agora a aceitá-los”, disse ainda.
Desconhece-se quais serão os valores indemnizatórios com que as autoridades pensam compensar estas famílias. Segundo revelou a voluntária da Caritas à Fundação AIS, esse valor poderá ser de cerca de 15 mil rupias por agregado familiar, ou seja, cerca de 80 euros.
“Estamos a pagar regularmente as nossas facturas de electricidade e de gás. Os departamentos governamentais aceitaram os nossos pagamentos por estes serviços públicos. Também devem ser responsabilizados”, diz Anun Arif. “O governo não partilhou detalhes sobre a operação de limpeza ou planos de reinstalação. Alugámos uma casa de dois quartos, mas muitos não têm para onde ir. Não queremos dinheiro ou terra, só precisamos de uma casa…” acrescenta esta jovem à Fundação AIS.
Esta operação governamental não atinge apenas a comunidade cristã. Cerca de 60% dos que vão ser afectados são muçulmanos. Arif diz que estes planos de reordenamento do espaço público vão afectar acima de tudo os mais pobres do Paquistão.
“O meu pai, um trabalhador sanitário, gastou todas as suas economias para construir a nossa casa de quatro quartos e de dois andares. Eu nasci lá. Muitos tornaram-se avós depois de se casarem na mesma povoação”, diz a voluntária da Caritas que acusa o governo de não estar a cumprir com as suas promessas de criação de 10 milhões de postos de trabalho e de providenciar 5 milhões de casas para as populações mais desfavorecidas. Ao contrário disso, alerta esta jovem à Fundação AIS, “estamos a ser transformados em pessoas sem-abrigo… Os nossos sonhos foram desfeitos…”
PA | Departamento de Informação da Fundação AIS | info@fundacao-ais.pt