É difícil quantificar a amplitude do desastre da passagem por Moçambique do Ciclone Chido. Numa altura em que as autoridades falam em pelo menos 70 mortos, o retrato da devastação é impressionante: milhares de casas destruídas ou danificadas, mas também Igrejas, capelas e estruturas paroquiais. Em resposta ao pedido de auxílio de emergência lançado pela Diocese de Pemba, a Fundação AIS avançou já com uma primeira ajuda de 40 mil euros… E da região de Cabo Delgado onde o terrorismo se mantém activo, continuam a chegar relatos de devastação e também de angústia perante um futuro que, agora, será ainda mais difícil, será ainda mais doloroso…
Este ciclone foi devastador, foi mesmo devastador. É assustador ver como em pouco tempo os ventos fortes deixaram um enorme rasto de destruição.
São as palavras de D. António Juliasse na madrugada de domingo, dia 15, quando o ciclone Chido ainda atravessava a região de Cabo Delgado. O Bispo de Pemba descrevia, à Fundação AIS, um cenário assustador em que praticamente todas as casas, todas as construções foram arrasadas ou parcialmente danificadas. “A população tem as casas construídas com materiais locais, casas feitas de estacas e embatocadas com barro e com cobertura de capim. Estas casas, boa parte delas, estão agora parcial, ou totalmente destruídas” relatou o Bispo.
Até as estruturas da Igreja, normalmente mais sólidas, construídas com materiais mais resistentes, também ficaram destruídas. “Nós temos perto de meia centena de igrejas destruídas, desde a sede paroquial às igrejas das comunidades cristãs”, relatava ainda D. Juliasse, anotando que, em muitos casos, os danos maiores estão relacionados com telhados ou coberturas que voaram ou ficaram muito danificados. “E temos também escolas, escolinhas, com os tectos que voaram ou estão no chão destruídos. E vários outros bens também estragados. Em Chiúre, a Fazenda de Esperança também tem os tectos todos danificados e, portanto, há muita destruição”, acrescentava o prelado.
DESTRUIÇÃO EM MAHATE
Na freguesia de São Carlos Lawanga, em Mahate, os efeitos da passagem do ciclone Chido “foram especialmente devastadores”. As palavras são do Padre Eduardo Roca, pároco neste bairro que é o coração do Islão na cidade de Pemba. Em mensagem enviada para a Fundação AIS, o sacerdote espanhol descreve como umas poucas horas de fúria dos ventos e de chuva inclemente deixaram um rasto de destruição que vai demorar agora muito tempo até ser ultrapassado.
A maior parte das casas, como tinha relatado o Bispo de Pemba à Fundação AIS, tem uma estrutura muito rudimentar. São normalmente paus entrelaçados, revestidos com barro e com colmo de capim a fazer de telhado. Grande parte dessas casas foram destruídas pelo ciclone. Mas até as construções mais robustas, da Igreja por exemplo, também não resistiram. “Todos os centros paroquiais, a escola primária, o pré-escolar, o novo centro paroquial, a nova igreja, foram afectados. Os telhados de todos eles sofreram bastante, sobretudo das escolas e do centro paroquial”, informa o Padre Eduardo. “A escola primária perdeu os telhados dos dois pavilhões de salas de aula e o ciclone arrancou também o telhado do novo centro paroquial. A nova construção das salas de aula do centro infantil também ficou sem tecto”, acrescenta o sacerdote que está em Mahate desde 2012.
Por sorte, este é um período de férias até meados de Fevereiro. Face ao elevado número de pessoas que perderam as suas casas, o Padre Eduardo Roca decidiu que a escola paroquial seria transformada em abrigo. “Mas a própria escola sofreu demasiado com os efeitos devastadores do ciclone”, explica. “Algumas salas mantiveram-se intactas, como a biblioteca e a sala de professores, onde cerca de 70 pessoas se refugiaram desde domingo. Outro grupo de 100 pessoas que se refugiou na igreja permanece nas salas do centro infantil que ainda aguentaram. Todos eles perderam as suas casas”, esclarece.
SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA
A aumentar as dificuldades no trabalho de acolhimento das vítimas do ciclone, há uma quebra na electricidade e nas comunicações. Segundo calcula o Padre Eduardo, a energia “demorará muito a ser restabelecida”. “Apenas na zona central da cidade de Pemba as comunicações estão a ser recuperadas.”
O ciclone atingiu a região norte de Moçambique no domingo, dia 15. Desde então, o padre Eduardo juntamente com alguns voluntários da Igreja tem procurado ajudar nos trabalhos de limpeza nos acessos ao bairro e nas estradas paroquiais. “Muitas árvores arrancadas e arrastadas pelo ciclone impedem o acesso”, explica.
Quando enviou a mensagem para a Fundação AIS, o Padre Eduardo Roca falava numa situação muito complexa com necessidades básicas ao nível da alimentação, abrigo e roupa. E muitas das pessoas afectadas pelo ciclone refugiaram-se, entretanto, em casas de familiares e amigos.
Encontramo-nos numa situação de emergência, que agrava a já complicada situação das nossas comunidades devido à agitação que se seguiu às eleições de 9 de Outubro e aos ataques terroristas que continuam na província. Sem dúvida, este vai ser um Natal novamente diferente.
Padre Eduardo Roca
O distrito de Mecufi foi outra das zonas mais severamente atingidas pelo Ciclone. A devastação foi grande por lá e até a casa das irmãs de São José de Chambéry sofreu alguns dados. Apesar disso, as religiosas acolheram muitas pessoas que chegaram ao local molhadas, cheias de frio e assustadas. “Com bastante força vinda de Deus, conseguimos providenciar lençóis, roupas secas, capulanas, para aquecer sobretudo bebés, crianças, mulheres e um senhor idoso bastante doente”, descreveu a Irmã Joana, numa mensagem que publicou na Internet.
NÃO ESQUECER OS ATAQUES TERRORISTAS
Relatos de outros responsáveis da Igreja mostram que a amplitude da destruição é realmente impressionante. Tal como o Padre Eduardo, também o Frei Boaventura recorda que a região norte de Moçambique que corresponde à Província de Cabo Delgado continua a ser palco de constantes ataques terroristas que têm sido responsáveis por muita destruição também.
Agora, a somar-se à violência desencadeada pelos grupos armados que reivindicam fazer parte do Daesh, a organização jihadista Estado Islâmico, as populações viram as suas casas, as suas propriedades, os seus parcos haveres a serem varridos e destruídos pela força do temporal. “O que os malfeitores não destruíram, não queimaram, foi destruído agora com o ciclone.” Referindo-se especialmente ao distrito de Mecufi, o religioso diz que “houve uma destruição total de todos os edifícios”, incluindo alguns da Igreja. “Uma capela que era da nossa casa e que o povo usava para as celebrações por que a igreja já tinha sido queimada tempos atrás, foi totalmente destruída…”
Muitos padres e religiosas têm procurado auxiliar as populações em maior necessidade. É o caso do Padre Kwiriwi Fonseca. Em mensagem enviada também nas últimas horas para a Fundação AIS, o sacerdote fez questão de partilhar “a tristeza” provocada pelo ciclone Chido. “Estive a auxiliar algumas pessoas que precisavam de movimentar-se. Estava na missão de Ocua. Depois, atravessei o rio Lúrio até à vila de Namapa. Foi uma situação devastadora ao longo da estrada, até Pemba. Lamento comunicar que de Mieze até Namapa, ao longo da estrada, as casas estão derrubadas. Muita gente sofreu… Não tiveram onde se refugiar…”
A Fundação AIS, que já tem muitos projectos de apoio à Igreja e às vítimas do terrorismo, reforçou o apelo aos seus benfeitores para gestos de solidariedade para com Cabo Delgado e avançou já com uma ajuda de emergência para a Diocese de Pemba no valor de 40 mil euros.
AJUDA DE EMERGÊNCIA
SOS Cabo Delgado
Paulo Aido | Departamento de Informação da Fundação AIS | info@fundacao-ais.pt