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MOÇAMBIQUE: “Foi uma surpresa para todos” a notícia da saída de D. Luiz de Pemba, diz sacerdote à Fundação AIS
Sexta-feira · 12 Fevereiro, 2021
“Total surpresa.” Foi assim que na Diocese de Pemba foi recebida a notícia de que o seu bispo, D. Luiz Fernando Lisboa, tinha acabado de ser nomeado pelo Santo Padre para Cachoeiro de Itapemirim, no Brasil.
O padre Edegard Silva, missionário saletino brasileiro, actualmente a residir na cidade de Pemba, confessou ontem à tarde à Fundação AIS que tinha “acabado de receber a notícia” e que não tinha havido tempo sequer para reflectir sobre o assunto. “Não fizemos ainda nenhuma reflexão, a notícia chegou aqui há tarde, nada foi conversado, e a gente acredita que a missão continua porque todos nós temos uma missão na diocese para com as comunidades… mas não foi ainda nada falado. Acabámos de receber a notícia…”
Para já, foi nomeado Administrador Apostólico ‘sede vacante’ de Pemba o Bispo Auxiliar de Maputo, D. António Juliasse Ferreira. Ele ficará à frente dos destinos da diocese até à nomeação de um novo prelado pelo Papa Francisco.
Diz o padre Edegard Silva que o próximo Bispo não tem de ser “uma pessoa igual a D. Luiz”. “Ninguém é igual a ninguém. Cada pessoa é uma pessoa, tem o seu carisma.” Vai a província de Cabo Delgado, território que tem estado no centro de ataques por parte de grupos armados e que atravessa uma profunda crise humanitária, perder a voz que tem denunciado esta situação trágica ao mundo?
O padre Edegard acha que não. Todos os padres, todos os missionários, todos os cristãos vão ser essa voz… “Nós estamos aqui. Então, se preciso for, a gente denunciar e fazer o papel que D. Luiz fazia, a gente vai fazer também. Até porque ele o fazia não pela força de ser bispo mas pela força da nossa missão, do nosso baptismo. É pelo baptismo que a gente se torna profeta. A gente espera que seja quem for que vá assumir [a diocese] todos nós, os baptizados daqui, os cristãos, assumem essa vocação profética que é vocação da Igreja, a vocação cristã.”
D. Luiz Fernando Lisboa está no Brasil, para onde se deslocou em Dezembro do ano passado para ser submetido a uma pequena operação às cataratas, como a Fundação AIS então revelou. O padre Edegard, acredita que D. Luiz irá ainda a Pemba para se despedir de todos os que o acompanharam na diocese desde Junho de 2013. “D. Luiz está no Brasil onde foi para fazer a cirurgia aos olhos. Com certeza ele volta [cá] para pegar as coisas, conversar e despedir-se de todos nós e do povo.”
A saída de D. Luiz Lisboa da diocese ocorre num momento muito delicado na vida da região norte de Moçambique, que tem sido palco de sucessivos ataques por grupos armados desde o final de 2017, ataques que, porém, ganharam grande intensidade durante o ano passado.
Na verdade, apesar de toda a acção que as forças de segurança têm promovido no combate aos grupos insurgentes – como os terroristas também são conhecidos localmente – o cenário parece continuar relativamente inalterado. Diz o padre Edegard à Fundação AIS em Lisboa que tudo “permanece do mesmo jeito”.
E dá exemplo do relativo impasse no combate aos terroristas. “Basta dizer que a fonte de energia de toda a região fica numa aldeia lá em Mocímboa da Praia. Toda a região está sem energia. Isso significa que o governo não tem como entrar lá nessa aldeia onde fica a fonte de alimentação da energia de toda a região. A própria cidade de Mueda, que é o grande referencial [vila e sede de distrito de Cabo Delgado], está sem energia há meses… O quadro não mudou muito.” Segundo este missionário, nas últimas semanas têm havido relatos de ataques de terroristas “na região de Nangade, Palma e até em Muidumbe”.
Calcula-se que, durante estes cerca de três anos de violência terrorista, já tenham morrido mais de duas mil pessoas e mais de 600 mil foram forçadas a abandonar tudo o que possuíam dada a violência extrema verificada nos ataques.
Aldeias destruídas, pessoas decapitadas, e ataques a lugares de culto passaram a ser situações correntes durante os ataques. A centenária missão católica em Nangololo, onde estava o padre Edegard Silva, foi um dos alvos dos terroristas, no final de Outubro de 2020.
Em declarações à Fundação AIS, o padre Edegard reconheceu então que tudo tinha sido destruído. “Foi tudo, tudo destruído. Tudo virou cinza. Todos os livros da secretaria, de baptismo, de casamento, de crisma, livros de [uma] história de 100 anos da paróquia, foi tudo destruído. Tudo. Eles foram muito violentos desta vez…”
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