O bairro de Cité-Soleil, na cidade de Port-au-Prince, foi palco, segundo responsáveis da ONU, de mais um episódio de violência extrema no Haiti, com “pelo menos 184 pessoas mortas”. Calcula-se que, desde o início do ano, já terão sido assassinadas cerca de 5 mil pessoas. No início de Dezembro, os bispos haitianos lançaram mais um apelo pelo fim de toda a brutalidade causada pelos gangues armados responsáveis por estes “actos atrozes”.
O alerta foi dado pela ONU. No último fim-de-semana, “pelo menos 184 pessoas foram mortas pela violência orquestrada pelo líder de um dos poderosos gangues” que operam na capital do país, a cidade de Port-au-Prince, denunciou Volker Türk, alto-comissário da ONU para o Haiti. Citado pela Vatican News, o responsável das Nações Unidas sublinhou que, com estes assassinatos, “o número de mortos no Haiti cresceu este ano para uns inacreditáveis 5 mil”.
No início do mês, no final de uma Assembleia Plenária, os bispos do Haiti renovaram o apelo pelo fim da “violência cega que arruína” todos os dias a sociedade, pedindo aos gangues armados para pararem com “estes actos atrozes” e lembrando, como sinal de esperança, o ano jubilar que terá início a 29 de Dezembro.
Já antes, a 15 de Novembro, a Conferência Episcopal tinha lançado um “grito de alarme” pela paz, na forma de uma carta dirigida ao Governo, à sociedade civil e a todas as pessoas de boa vontade. “Não há verdadeira paz no país”, descreveram os bispos, traçando um retrato sombrio da vida no Haiti, com a capital isolada, escolas fechadas, actividades interrompidas e até o aeroporto internacional encerrado, “isolando o Haiti do resto do mundo”.
Antes disso, em Outubro, no dia 13, foi o próprio Papa Francisco a comentar a situação que se vive no Haiti. Logo após a recitação do Angelus, o Papa falou na “dramática” situação no Haiti:
A violência continua contra a população, forçada a fugir das suas casas em busca de segurança noutros locais, dentro e fora do país.
Papa Francisco
AMEAÇA GENERALIZADA
Mas têm sido muitos os alertas de responsáveis da Igreja pela degradação da situação neste país. Em Março deste ano, por exemplo, em declarações à Fundação AIS Internacional, D. Max Leroy Mésidor, Arcebispo Metropolitano de Port-au-Prince e presidente da Conferência Episcopal, denunciava já uma situação terrível, dizendo que existia “o perigo real de eclosão de uma guerra civil”. E descrevia o que se passava na sua própria diocese.
Não posso visitar dois terços da minha diocese porque as estradas estão bloqueadas. Para chegar ao sul da diocese, tenho de apanhar um avião. Há dois anos que não vou à catedral.
D. Max Leroy Mésidor
No mês seguinte, em Abril, era uma religiosa portuguesa espiritana em missão no Haiti desde 2016, a referir-se ao drama da violência. Em mensagem enviada para a Fundação AIS em Lisboa, a Irmã Helena Queijo dizia, no seguimento de uma vaga de raptos de padres e religiosas, que, “infelizmente, não é só a Igreja Católica que está na mira dos gangues”.
“É claro que raptar membros da Igreja dá mais nas vistas e chama mais a atenção da comunidade internacional. Mas, todos os dias, muitas pessoas são raptadas e de todas as idades, categorias, católicos, protestantes e outros. Muitos ficam meses em cativeiro, outros são libertados e outros nunca mais aparecem”, acrescentou a religiosa na entrevista à Fundação AIS.
RELATÓRIO DA FUNDAÇÃO AIS
O Haiti é um dos países assinalados a vermelho no mais recente Relatório sobre a Liberdade Religiosa no Mundo, publicado em Junho do ano passado pela Fundação AIS e que aborda o período correspondente aos anos de 2021 e 2022.
Nesse documento pode ler-se que o país “entrou numa espiral de caos político, económico e social”, e que “as estruturas estatais como o Parlamento, o poder judicial e a administração pública entraram em colapso”.
Tudo isto se agravou com o assassinado, em Julho de 2021, do presidente Jovenal Moïse. “Desde então” – assinala o Relatório da AIS – “o país tem sido dirigido pelo presidente Ariel Henry, sem data ainda marcada para novas eleições”.
“Num país já assolado pela pobreza e por catástrofes naturais, o vazio de poder e a falta de liderança efectiva mergulharam o pequeno estado das Caraíbas no caos, com fome, doenças, violência de gangues, crimes relacionados com a droga, esquadrões da morte e raptos”, pode ler-se também no referido relatório.
DESLOCADOS E AJUDA NO HAITI
De facto, o Haiti, que é considerado como o país mais pobre do Hemisfério Ocidental, está mergulhado numa profunda crise política, social e económica há muito tempo. No início de Julho deste ano, calculava-se que havia já quase cerca de 600 mil pessoas deslocadas dentro do Haiti.
Em 2024, a Fundação AIS apoiou a Igreja no Haiti através de quase 70 projectos com mais de 1,5 milhões de euros. Entre outros, foram promovidas estações de rádio diocesanas, projectos de painéis solares, bem como a formação de futuros sacerdotes, religiosas e catequistas. Além disso, foi fornecida ajuda financeira às irmãs e Estipêndios de Missa aos padres.
Paulo Aido | Departamento de Informação da Fundação AIS | info@fundacao-ais.pt