Pelo menos 64 pessoas foram assassinadas num brutal ataque terrorista entre os dias 8 e 9 de Setembro na localidade de Ntoyo, na província de Kivu do Norte, na República Democrática do Congo. A Fundação AIS expressa profunda consternação e solidariedade para com as famílias afectadas. Entretanto, dias antes, em Kisangani, um padre foi assaltado e baleado. O missionário português Marcelo Oliveira fala num ambiente de “medo e terror”.
O ataque no início da segunda semana de Setembro em Ntoyo, paróquia de São José de Manguredjipa, foi atribuído ao grupo armado ADF (Forças Democráticas Aliadas), e provocou – segundo fontes locais próximas da Fundação AIS – pelo menos 64 mortos, muitos deles assassinados enquanto participavam num velório.
Os agressores usaram armas de fogo e martelos, e algumas casas foram incendiadas selectivamente, o que sugere uma estratégia premeditada de terror. As autoridades locais iniciaram, entretanto, o enterro das vítimas e a implementação de novas medidas de segurança.
O ADF, grupo originário do Uganda, é uma organização insurgente islâmica que, desde 2019, se alinhou formalmente com o Estado Islâmico, integrando a sua Província da África Central (IS-CAP). O grupo tem sido responsável por múltiplos massacres no leste do Congo, caracterizados por violência extrema contra civis, especialmente cristãos.
Neste contexto de dor, a Fundação AIS une-se à mensagem de compaixão enviada por Monsenhor Melchisédech Sikuli Paluku, bispo de Butembo-Beni.
A todas as famílias afectadas por esta enésima e horrível carnificina [...] bem como a todos os fiéis da paróquia, expressamos a nossa proximidade espiritual. Que Deus, o Mestre da Vida, nos fortaleça por intercessão da Santíssima Virgem Maria, Consoladora dos aflitos, e nos conduza para além do deserto dos sofrimentos presentes, rumo a uma paz duradoura.”
Monsenhor Melchisédech Sikuli Paluku
Outros ataques, muita violência…
Este ataque vem somar-se a uma série de atrocidades recentes às quais a Fundação AIS já fez eco. No passado dia 27 de Julho, por exemplo, pelo menos 40 pessoas, incluindo muitos jovens, foram assassinadas durante uma vigília de oração numa igreja em Komanda, Ituri. Em Fevereiro, mais de 70 corpos foram encontrados também numa igreja protestante em Lubero, muitos deles estando amarrados e decapitados.
A situação no leste do Congo é de facto alarmante. A violência intensificou-se em toda a região de Kivu do Norte e do Sul, provocando deslocações em massa das populações e uma grave crise humanitária. Apesar de várias províncias estarem sob estado de sítio há anos, com a presença das forças armadas congolesas (FARDC), tropas ugandesas (UPDF) e da missão da ONU (MONUSCO), os ataques continuam.
A Conferência Episcopal Nacional do Congo (CENCO) denunciou que, nessas zonas, a população continua a ser vítima de assassinatos e sequestros, e classificou os factos como “massacres odiosos” perpetrados contra fiéis inocentes.
A Fundação AIS reitera o seu compromisso para com a Igreja na República Democrática do Congo, um dos 10 países que mais ajuda recebem da instituição pontifícia, e pede orações pelas vítimas deste novo atentado, pelas suas famílias e por toda a comunidade cristã. Da mesma forma, a Fundação AIS apela à comunidade internacional para agir com urgência. É imperativo proteger os civis, garantir a liberdade religiosa e trabalhar por uma paz duradoura nesta região martirizada de África onde actuam impunemente mais de 120 milícias e grupos violentos, especialmente nas províncias orientais da República Democrática do Congo, incluindo Ituri, Kivu do Norte, Kivu do Sul e Tanganyika.
“Medo e terror” também em Kisangani
Mas não é só nesta zona que há incidentes na República Democrática do Congo. Dias antes do massacre em Ntoyo, a 5 de Setembro, um sacerdote foi baleado e roubado na cidade de Kisangani, no centro-norte do país, tendo ficado ferido, embora sem gravidade. Também nesta cidade, um convento e casas religiosas, nomeadamente pertencentes às carmelitas e às irmãs da Imaculada Conceição, foram assaltadas.
Para o missionário Marcelo Oliveira, um padre comboniano português a viver há vários anos na República Democrática do Congo, tudo isto permite falar em ambiente de “medo e terror”.
“É uma realidade recorrente, a insegurança, seja em Kisangani, seja na parte este, onde tudo continua com muita insegurança, ataques constantes, gente que morre todos os dias”, descreve o sacerdote em mensagem enviada para a Fundação AIS em Lisboa. “A igreja continua a denunciar, a igreja está presente, os bispos continuam a dizer o que se passa, a dar notícias, mas são tudo pequenos focos de informação que não chegam muito longe e que não são muito ouvidos”, lamenta o missionário.
“Isto é a realidade infeliz do sofrimento humano, que não toca os corações dos grandes, que já estão insensíveis ao sofrimento do povo”, diz, concluindo que “atacar pessoas inocentes, pessoas que estão a passar na rua e assassiná-las sem que se possam defender, sem terem nenhuma razão, é algo de uma crueldade extrema.”
Maria Lozano e Paulo Aido
Departamento de Informação da Fundação AIS | info@fundacao-ais.pt