NIGERIA: “Apontaram-me uma arma e levantei as mãos em sinal de rendição”, recorda padre sobre o momento em que foi raptado

Estava a viajar de carro já há três horas, a caminho de Maiduguri, juntamente com mais duas pessoas, pois ia participar num workshop, quando se deu uma emboscada. Foi no dia 21 de Junho. Num poderoso testemunho enviado para a Fundação AIS, o Padre Alphonsus Afina recorda como foi raptado, agredido e levado para uma zona na montanha, onde esteve em cativeiro durante 51 dias às mãos de uma das organizações terroristas que operam na Nigéria.

Dia 1 de Junho. O Padre Alphonsus Afina estava a viajar de carro, juntamente com duas pessoas da Comissão de Justiça, Desenvolvimento e Paz, que iam também participar num seminário em Maiduguri, quando se deu a emboscada.

De súbito, junto à estrada, há uma explosão. Quase de imediato, escutam-se tiros e homens armados saltam literalmente do meio dos arbustos, do meio do mato, e começam a disparar sobre os veículos. Era o princípio de um sequestro que se iria prolongar por 51 dias, às mãos do grupo jihadista JASDJ – Jama’at Ahl ai Sunna li Da’awa wal Jihad. “Na confusão que se gerou, abandonei o meu veículo na estrada e corri para trás”, descreve o Padre Alphonsus, num depoimento enviado para a Fundação AIS Internacional e em que recorda os momentos-chave do que lhe aconteceu nesse primeiro dia de Junho, pouco depois do meio-dia. “Outros veículos de transporte público também foram abandonados na estrada, e os passageiros e motoristas correram em todas as direções”, diz o sacerdote.

Pouco antes da emboscada, tinham cruzado um posto de controlo militar em Límankara. Talvez por isso, o Padre Alphonsus pôs-se a correr nessa direcção. Mas não conseguiu ir muito longe.

Os homens armados vieram atrás de nós em motocicletas. Aproximaram-se de mim e pediram que eu parasse, apontaram-me uma arma. Parei e levantei as mãos em sinal de rendição.”

REVISTADO E ROUBADO

Era o começo. Os terroristas revistaram-no. “Recolheram os meus dois telemóveis e pediram a senha. Mostrei-lhes a senha de desbloqueio. Tiraram-me o relógio de pulso, revistaram os meus bolsos e levaram o dinheiro que eu tinha e mandaram-me subir para a motocicleta.”

O padre ficou sentado entre dois terroristas, o que conduzia a motorizada e outro homem armado. Voltaram para trás, na estrada, para onde tinha ficado o carro, entretanto já vandalizado. Praticamente tudo já tinha desaparecido de dentro do automóvel, desde malas com roupas, sapatos, pertences pessoais, dinheiro, até o missal romano, um aparelho de router, três computadores portáteis (o do sacerdote e os dos dois membros da Comissão de Justiça, Desenvolvimento e Paz, que o acompanhavam), e acessórios como um disco rígido externo, um teclado, um rato… Levaram tudo.

AGREDIDO NO ROSTO

É nessa altura que começam também a agredir o Padre Alphonsus. Ainda hoje ele tem marcas visíveis das pancadas que sofreu. “Ao chegar ao veículo, os homens armados começaram a espancar-me e, como resultado, sofri uma lesão no olho, com sangue a escorrer do meu rosto para o meu olho e a correr pelo meu ombro. O meu olho ficou inchado e a libertar líquido durante 3 semanas”, recorda o sacerdote.

Dali partiram para a montanha Gwoza. Um dos terroristas levou o carro do padre para uma zona de mato, perto da montanha, juntamente com outros três veículos que levavam todos os que haviam sido sequestrados. O Padre Alphonsus foi no banco de trás do seu próprio automóvel juntamente com mais dois prisioneiros. À frente, ao lado do condutor, estava um terrorista armado, mas outros, também armados, seguiam no carro sentados na bagageira.

VIGIADO POR HOMENS ARMADOS

Dirigiam-se para o sopé da montanha, onde houve uma troca de tiros com soldados do exército. “Para evitar sermos atingidos durante o tiroteio e para nos manter em segurança, alguns dos homens armados levaram-nos rapidamente para a montanha”, relata o padre. Naquele dia, os terroristas fizeram 14 reféns, mas algumas das pessoas que seguiam nos autocarros de transporte público e que também foram emboscadas conseguiram fugir. Outros, tiveram menos sorte e foram mortos, um dos quais era um dos membros da Comissão de Justiça, Desenvolvimento e Paz que acompanhava o Padre Alphonsus no carro.

“Enquanto estive em cativeiro, dormi na mesma sala com outros quatro reféns, sempre com homens armados de guarda”, recorda o sacerdote.  Entretanto, as forças de segurança mobilizaram efectivos para a região, desencadeando uma operação militar contra os terroristas. Foi um tempo de medo que, diz o padre, deixou também marcas ao ponto de ainda hoje ter dificuldade em adormecer.

“Três semanas após o meu cativeiro, houve uma operação militar com ataques aéreos e bombardeamentos de artilharia no local onde estávamos detidos. Desde então, tenho tido dificuldade em dormir devido ao medo de ser morto. Esta situação mantém-se enquanto escrevo isto”, relata o padre no depoimento enviado para a Fundação AIS Internacional.

LIBERTADO AO FIM DE 51 DIAS

A libertação do padre aconteceria ao fim de 51 dias de cativeiro, a 21 de Julho, por volta das 17 horas. A primeira preocupação dos responsáveis da Diocese de Maiduguri foi a de levar o Padre Alphonsus Afina até ao hospital para um exame médico. As agressões que sofreu logo no primeiro dia de cativeiro deixaram marcas que ainda agora são visíveis e que o vão obrigar a submeter-se a uma cirurgia.

“Agora estou a tomar medicamentos para várias doenças e vou usar óculos até à data da minha cirurgia aos olhos, devido à lesão que sofri quando fui capturado”, explica, agradecendo a todos os que, ao longo dos 51 dias de cativeiro nunca deixaram de rezar pela sua libertação.

“Sou grato a todos os nossos parceiros, padres/religiosos/leigos da Diocese de Maiduguri, Diocese de Fairbanks, Alasca [onde esteve em missão durante cerca de 6 anos], residentes do Alasca, amigos, todos os que me desejam o bem em todo o mundo e aqueles que foram fundamentais para a minha libertação. Senti os efeitos das orações oferecidas por mim em todo o mundo na forma como os homens armados (Jama’at Ahl ai Sunna li Da’awa wal Jihad [JASDJ]) me trataram posteriormente”, diz, concluindo o seu testemunho dizendo que, “acima de tudo”, está grato a Deus por ter poupado a sua vida “durante esta experiência assustadora”.

O cativeiro e posterior libertação do Padre Alphonsus Afina ocorre num momento em que o norte da Nigéria continua a enfrentar violência severa por parte de grupos extremistas, com diversas situações de sequestros e ataques contra as populações. O Padre Alphonsus foi o 15º religioso a ser raptado na Nigéria desde o início deste ano.

Paulo Aido | Departamento de Informação da Fundação AIS | info@fundacao-ais.pt

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