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MOÇAMBIQUE: Líderes religiosos assumem urgência da sensibilização dos jovens para não aderiram ao terrorismo
Na segunda-feira, 3 de Janeiro, dia em que se registou um novo ataque terrorista em Cabo Delgado, os líderes religiosos desta província situada a norte de Moçambique publicaram uma “Declaração” em que se pronunciam sobre a violência que tem vindo a afectar esta região desde Outubro de 2017.
D. António Juliasse, Administrador Apostólico de Pemba, é um dos subscritores deste documento, a par de vários líderes muçulmanos, nomeadamente os Sheikhs Nzé Assuate, do Conselho Islâmico de Moçambique e Abdul Incacha, da Comunidade Islâmica de Cabo Delgado.
A “Declaração Inter-Religiosa de Pemba”, enviada para a Fundação AIS, e que foi também subscrita pelo Pastor Alberto Sabão, do Conselho Cristão de Moçambique, apresenta um conjunto de compromissos, procurando-se, de forma activa, “mobilizar e sensibilizar” os adolescentes e jovens através de mensagens “que desencorajem a aderência ao extremismo”.
Por coincidência, a divulgação desta Declaração ocorre no dia em que, no distrito de Macomia, grupos armados realizaram mais um ataque violento, matando cinco pessoas, incendiando mais de uma dezena de casas e saqueando a comida existente na aldeia Nova Zambézia.
Esta não foi a primeira vez que esta aldeia foi alvo de ataque. Ainda recentemente, a 15 de Dezembro, e como a Fundação AIS então revelou, um catequista e animador da palavra da comunidade São Paulo foi assassinado quando estava a deslocar-se para a machamba – terreno usado para a agricultura –, na companhia da mulher e filhos. O catequista Matias Bustam acabaria por ser assassinado de “forma cruel”.
Na declaração agora divulgada em Cabo Delgado, os líderes religiosos locais repudiam de forma veemente todas as formas de violência e extremismo, assumindo o compromisso de trabalharem em conjunto para que a sociedade não olhe para a religião “como causa de qualquer conflito”, e rejeitando que “sejam atribuídos os actos terroristas à religião muçulmana”, assim como qualquer afirmação “que associe tais actos aos princípios do Islão”.
De facto, os ataques terroristas têm vindo a ser reivindicados por grupos armados que se dizem afiliados no auto-proclamado “Estado Islâmico”.
Um dos propósitos da declaração dos líderes religiosos de Cabo Delgado – e que resultou de um encontro que decorreu na cidade de Pemba nos dias 14, 15 e 22 de Dezembro do ano passado –, é precisamente o de desenvolver um trabalho pedagógico junto das populações, explicando que “todas as religiões” são contrárias à violência e que é essencial “acolher, acompanhar e reabilitar” todas as pessoas, especialmente adolescentes e jovens, que de alguma forma foram vítimas ou sofreram “o impacto da violência” terrorista. Para os líderes religiosos de Cabo Delgado, este é um trabalho que tem de ser realizado ao nível do apoio “psicossocial e espiritual intenso e demorado”, não só “do lado das vítimas” mas também “dos perpetradores”, de forma a “alcançar a sua reconciliação e reinserção social”.
O documento assinado pelo bispo D. António Juliasse e os outros líderes religiosos de Cabo Delgado oferece uma análise importante sobre as causas que poderão explicar o surto de violência terrorista no norte de Moçambique e que, segundo as informações mais recentes, tende a alastrar para a província de Niassa.
Afirmando que Cabo Delgado se encontra “mergulhada” numa crise humanitária profunda, os signatários do documento apontam como causa da violência, uma “regressão dos indicadores de desenvolvimento integral, também agravada pelas consequências das medidas restritivas de prevenção contra a pandemia da Covid 19, e vários outros factores preocupantes, como as desigualdades sociais que a província atesta historicamente, o elevado índice de analfabetismo, a crise de valores ético-morais, e as polarizações étnicas e religiosas que ameaçam o actual contexto e convívio social, entre outros problemas que violam a dignidade humana”.
O encontro, sob a forma de seminário, decorreu sob a inspiração do documento da Fraternidade Humana em prol da Paz, também conhecido como Declaração de Abu Dhabi, e que foi assinada em Fevereiro de 2019 pelo Papa Francisco e o Grande Imame de Al-Azhar.
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