O Cardeal Piero Parolin esteve em Moçambique em visita oficial em representação do Santo Padre e deslocou-se à Diocese de Pemba, o epicentro da violência terrorista que tem assolado Cabo Delgado. O Secretário de Estado do Vaticano visitou um campo de deslocados, escutou lamentos de vítimas do terror jihadista e destacou os “testemunhos heroicos de fé” dos cristãos. Parolin enalteceu também o trabalho que a AIS está a desempenhar neste país, “ajudando as comunidades que tanto necessitam”.
Numa altura em que a região norte de Moçambique enfrenta uma nova onda de violência terrorista, nomeadamente na província de Nampula, com milhares de pessoas em fuga e ataques contra a comunidade cristã, o Secretário de Estado do Vaticano esteve de visita entre os dias 5 e 10 de Dezembro a este país africano de língua oficial portuguesa para assinalar os 30 anos das relações diplomáticas com a Santa Sé. Uma visita que não se ficou pelos discursos oficiais e protocolares, pois o representante do Papa fez questão de viajar até Pemba, a diocese que corresponde à Província de Cabo Delgado e que é o epicentro da violência jihadista desde Outubro de 2017.
Foi aí, em Pemba, que o Cardeal Parolin escutou de viva-voz testemunhos de pessoas que sofreram na pele o terror dos homens armados que reivindicam pertencer ao Estado Islâmico de Moçambique e que já causaram mais de 6300 mortos e mais de 1 milhão de deslocados. Foi o caso de um cristão que relatou a perda de um tio e de três irmãos, todos assassinados na zona norte da província de Cabo Delgado.
Mas o Cardeal Parolin ouviu também o relato de padres e religiosas que cumprem a sua missão em lugares menos seguros, arriscando também aí a própria vida. D. António Juliasse, Bispo de Pemba, acompanhou o prelado em todos esses momentos e sintetiza a visita ao campo de deslocados como “muito emocionante e tocante”.
“O cardeal Parolin saudou os deslocados quase um por um, apertando-lhes as mãos e abençoando as suas crianças, quase querendo abraçar cada um e tocar solidariamente as suas mais profundas feridas, para também participar do mesmo sofrimento e da mesma esperança”, disse, num relato minucioso enviado para a Fundação AIS sobre estes dois dias muito intensos de visita.
O Cardeal escutou de todos, padres, religiosas, catequistas e deslocados, o que significa ser Igreja “num contexto de violência jihadista, uma igreja perseguida, uma igreja em sofrimento”, descreveu D. Juliasse.
“Não estais sozinhos…”
Numa das suas intervenções em Pemba, o Cardeal Parolin fez questão de sublinhar precisamente o exemplo dos que não têm vacilado face ao terror jihadista em Moçambique.
Vim para vos dizer a todos, homens e mulheres do povo de Deus que caminha em Cabo Delgado, que não estais sozinhos. Não estais sozinhos! O Santo Padre e toda a Igreja una e universal estão convosco. Os vossos sofrimentos, os vossos medos e receios, mas também as vossas esperanças, estão no coração da Mãe Igreja e encontram um lugar especial no coração do sucessor de Pedro.”
D. Piero Parolin
E o Cardeal lembrou que o próprio Papa ainda muito recentemente convidou quatro catequistas da Diocese de Pemba para as celebrações jubilares em Roma. E isso foi mais do que um convite, foi “um sinal de proximidade e de encorajamento espiritual e pastoral”, afirmou. Nessa mesma intervenção, sempre ao lado do Bispo D. António Juliasse, o Cardeal Parolin destacou “os testemunhos heroicos de fé de tantos irmãos e irmãs que permanecem fiéis a Cristo nestes tempos de dor e de prova, e também daqueles que foram mortos sem negar o nome de Jesus”.
E do Bispo de Pemba escutou o que tem sido a violência jihadista em Cabo Delgado. Os números são trágicos.
Desde 2017, quando começaram os ataques, já foram mortos mais de 300 católicos, “a maioria por decapitação”, disse o Bispo de Pemba. Mas a violência parece não ter fim. Só este ano de 2025, “foram mortos 34 cristãos católicos, entre catequistas, animadores e fiéis”, acrescentou D. António Juliasse.
Cardeal aplaude trabalho da AIS
Durante a visita a Pemba, o responsável do Vaticano referiu-se por diversas vezes à importância do trabalho que a Diocese realiza, “apesar de não dispor de muitos recursos materiais e humanos”. Mas mesmo sem esses recursos, tem enfrentado grandes desafios ao nível do “cuidado pastoral e da assistência humanitária aos numerosos deslocados”, áreas em que a Fundação AIS tem colaborado activamente.
E o Secretário de Estado do Vaticano fez questão de reconhecer isso numa declaração ainda em Pemba. “Apercebi-me agora do papel que a Ajuda à Igreja que Sofre está a desempenhar aqui. Estou muito satisfeito com isso”, afirmou, recordando que já conhece a instituição desde os tempos em que esteve na Venezuela como núncio apostólico, entre os anos de 2009 a 2013. “Tivemos bastantes ocasiões de colaborar”, acrescentou.
“Felicitações e continuem realmente a apoiar e a ajudar estas comunidades que tanto necessitam. Temos verdadeiramente de manifestar-lhes a solidariedade da Igreja Universal de uma forma muito concreta, e vós estais a fazê-lo”, concluiu, dirigindo-se à Fundação AIS.
O próprio bispo da Diocese de Pemba também o referiu ao próprio Secretário de Estado do Vaticano. “A Diocese de Pemba informou o cardeal a respeito das doações que recebe de parceiros, particularmente da Fundação Ajuda à Igreja que Sofre, que tanto têm possibilitado amparar os mais necessitados, dentre tantos deslocados e outros vítimas da guerra”, explicou D. António Juliasse, numa mensagem de balanço da visita, reconhecendo, porém, que as ajudas, globalmente consideradas, têm vindo a diminuir, apelando, por isso, a que haja uma “partilha generosa para que os mais necessitados possam ser socorridos”.
Testemunho de esperança
Tal como para D. António Juliasse, também o Bispo de Tete considera que esta visita foi um sinal da proximidade do Papa ao povo sofrido de Moçambique. A visita “exprime a solidariedade e proximidade do Papa Leão XIV que, na linha do Papa Francisco, tem feito apelos à paz em Moçambique”. Segundo D. Diamantino Antunes, com esta viagem através do Cardeal Parolin o Santo Padre deu “o seu testemunho de esperança e consolação em nome de toda a Igreja ao povo moçambicano”.
A importância desta visita foi também sublinhada pelo Padre Eduardo Roca, responsável pelo diálogo inter-religioso na Diocese de Pemba. Para o sacerdote, o facto de o Cardeal Parolin ter estado em Pemba dá aos padres e às religiosas e aos catequistas “a força moral de saber que nunca estaremos sós, que a nossa Igreja está preocupada, que nos acompanha, que nos protege. E, para estar em lugares de missão assim, com tanta violência, tanta ameaça… é muito importante sentir que a Igreja está aí, que te apoia, que não estás sozinho. Isso é fundamental”, conclui.
Onda de violência
A visita do Cardeal Parolin ocorreu numa altura em que a violência terrorista tem estado particularmente activa, ultrapassando já as fronteiras de Cabo Delgado. No distrito de Nampula, numa zona que corresponde à Diocese de Nacala, e como a Fundação AIS noticiou na ocasião, pelo menos quatro cristãos foram mortos, pelo menos um deles decapitado, num autêntico raide terrorista que começou a 10 de Novembro e durou vários dias, com relatos de dezenas de casas destruídas, capelas queimadas e milhares de pessoas em fuga. D. Alberto Vera, Bispo de Nacala, numa declaração à fundação pontifícia, afirmou ter sido “uma semana de terror e de muito sofrimento”.
Face a esta situação, ao drama humanitário ainda em curso, D. Alberto Vera deixou um apelo às orações de todos. “Rezem muito por nós, pois realmente precisamos disso.”
Paulo Aido | Departamento de Informação da Fundação AIS | info@fundacao-ais.pt







