Duas cristãs, que estão detidas na mal afamada prisão de Evin, subscreveram uma carta-aberta em que reclamam o fim dos julgamentos e execuções sumárias que o regime de Teerão tem vindo a realizar na sequência das manifestações de protesto após a morte de Masha Amini, em Setembro, pela chamada ‘polícia da moralidade’ do regime por não estar a usar de forma correcta o véu islâmico.
Na carta-aberta, que tem a assinatura, segundo a agência de notícias AsiaNews, de um total de três dezenas de mulheres iranianas, as reclusas apresentam-se como “prisioneiras políticas e por delito de pensamento” e exigem “o fim das execuções dos manifestantes e o fim das sentenças injustas impostas às prisioneiras no Irão”.
As trinta mulheres declaram que pertencem a diferentes culturas e religiões, por exemplo, cristãs, baha’is, monárquicas, marxistas ou ambientalistas, mas que “estão unidas pela batalha contra as execuções por crimes contra o Estado”.
Segundo a AsiaNews, que cita o ‘site’ “Artigo 18”, especializado na documentação dos casos de repressão na República Islâmica do Irão, as duas mulheres cristãs são Sara Ahmadi e Malihe Nazari, e cumprem respectivamente oito e seis anos de prisão por pertencerem a “igrejas domésticas”.
No mais recentre Relatório sobre a Liberdade Religiosa no Mundo, editado pela Fundação AIS em Abril de 2021, refere-se que “qualquer actividade destinada a difundir o Evangelho é contra a lei” no Irão, e que “os cristãos das Igrejas não registadas, especialmente as Evangélicas, são considerados inimigos do Estado e alvo de perseguição sistemática”.
O Relatório enfatiza que os convertidos do Islamismo ao Cristianismo – a situação em que se encontram as duas mulheres cristãs que subscreveram a carta-aberta – “enfrentam sérias ameaças à sua liberdade, integridade física e vida”.
Estas duas cristãs, Sara Ahmadi e Malihe Nazari, não são as únicas que foram detidas na sequência dos protestos pela morte da jovem curda. No final do ano passado, a 26 de Novembro, Bianka Zaia, uma mulher cristã assíria de 38 anos de idade, foi também detida pela polícia e esteve na prisão de Evin, nas imediações de Teerão, a capital iraniana, acabando por ser libertada sob fiança ao fim de alguns dias.
Na altura da sua detenção, agentes da polícia estiveram na sua casa e apreenderam diversos objectos como o computador pessoal e telemóveis, “além de uma Bíblia e imagens religiosas”, segundo fontes locais citadas na ocasião pela agência AsiaNews, do Pontifício Instituto das Missões Estrangeiras.
Desde que os protestos começaram, a 16 de Setembro, calcula-se que terão já morrido mais de meio milhar de manifestantes, dos quais cerca de sete dezenas menores de idade, calculando-se ainda que terão sido detidas mais de 18 mil pessoas.
O Papa Francisco manifestou também a sua preocupação pela situação no Irão no discurso que proferiu no dia 9 de janeiro perante o Corpo Diplomático no Vaticano. “O direito à vida é ameaçado também onde se continua a praticar a pena de morte, como está a acontecer nestes dias no Irão, na sequência das recentes manifestações que pedem maior respeito pela dignidade das mulheres.”
Os cristãos são uma muito pequena minoria no Irão, apenas 0,7% da população, ou seja, cerca de 600 mil pessoas. O país é uma república constitucional teocrática estabelecida pela Revolução Islâmica de 1979, quando o Xá da Pérsia foi derrubado.
O maior obstáculo à liberdade religiosa, segundo o Relatório da Fundação AIS, é a “apostasia”, que pode dar origem a condenação à morte. Além disso, pode ler-se ainda no documento, “o Governo continua a fazer cumprir a segregação de género em todo o país” e espera-se “que as mulheres de todos os grupos religiosos adiram ao vestuário islâmico em público, incluindo cobrirem o cabelo”.
No referido Relatório sobre a Liberdade Religiosa no Mundo, reconhece-se que o “sistema teocrático da República Islâmica do Irão, sob o domínio de uma casta clerical, não é compatível com muitos direitos humanos, incluindo o direito à liberdade religiosa, tal como definido pelas convenções das Nações Unidas”.