FRANÇA: Aumento de actos anticristãos leva grupo de senadores e pedir medidas de protecção do governo

Nos primeiros cinco meses deste ano, foram registados 322 actos anticristãos em França, nomeadamente incêndios em Igrejas, furtos de objectos litúrgicos, templos vandalizados… Face a esta situação, um grupo de 86 senadores pediu ao governo para tomar medidas de protecção. Frei Luís Almeida Monteiro, dominicano, responsável do património artístico desta comunidade religiosa em França, reconhece “com tristeza”, em declarações à Fundação AIS, que “a violência é crescente”.

Em França, durante os primeiros cinco meses deste ano, foram registados pelas autoridades 322 actos anticristãos, o que se traduz num aumento de 13% em relação ao mesmo período do ano passado. Em causa estão incêndios criminosos, ataques a pessoas, actos de vandalismo e profanação de Igrejas e furtos de objectos litúrgicos.

Na região de Landes, relativamente perto da fronteira com Espanha, pelo menos 27 igrejas foram vandalizadas ou profanadas em apenas algumas semanas. Recentemente, a 6 de Setembro, uma cruz cristã que estava no espaço público foi profanada em Nice. O prefeito da cidade [equivalente a presidente de Câmara], afirmou ter-se tratado de um acto “inaceitável”, e a diocese, em comunicado, expressou a sua preocupação e fala no “ressurgimento de ataques antireligiosos” que afectam “a sagrada dignidade de cada ser humano”.

Bem mais grave foi o assassinato, em Lyon, de um cristão iraquiano de 45 anos, que tinha fugido do seu país no auge da perseguição religiosa jihadista em 2014, e que foi esfaqueado mortalmente a 10 de Setembro quando estava na sua cadeira de rodas a fazer um vídeo para as redes socais, onde costumava falar sobre a sua fé cristã.

“Um ataque à República”

Todos estes casos motivaram uma tomada de posição pública por um grupo de 86 senadores. Num artigo de opinião publicado a 26 de Setembro no site “Boulevard Voltaire”, os dirigentes apelaram ao governo a tomada de medidas de protecção para a comunidade cristã.

Exigimos acções imediatas. Para assegurar a liberdade de culto a todos os cidadãos franceses, é urgente implementar um sistema nacional de registo e apoio às vítimas de actos anticristãos, acessível ao grande público, transparente e eficaz.”

Mais do que a resposta a actos de violência está em causa, afirmam os senadores, a liberdade de culto. “Todo o ataque à fé de um cidadão é um ataque à própria República”, escrevem os 86 signatários da carta, lembrando que os cristãos têm de ser colocados em pé de igualdade face aos crentes de outras religiões que têm também sofrido incidentes de maior ou menor gravidade.

“Quando uma sinagoga é profanada, uma mesquita é atacada ou uma igreja é vandalizada, é sempre a mesma liberdade essencial que é ameaçada, a mesma ferida infligida à convivência. No entanto, hoje, os cristãos não têm uma ferramenta equivalente à sua disposição para alertar, proteger-se e obter justiça. Essa assimetria é insustentável”, afirmam.

A “tristeza” do frade português

José Luís Monteiro é frade dominicano e responsável do património artístico da Província dominicana de França Depois de viver décadas neste país, actualmente é capelão da missão católica francesa em Zurique, na Suíça, mas acompanha tudo o que de mais relevante se passa por lá. Em declarações à Fundação AIS, o religioso assume a sua “tristeza” pela constatação de que há um aumento dos actos anticristãos em França.  Um aumento que, reconhece, “tem sido bastante significativo”.

Na sua opinião, para se compreender o que está a acontecer “é preciso lembrar que a sociedade francesa actualmente vive uma situação muito fragmentada politicamente”. E acrescenta: “Li, por exemplo, que o partido da Mélenchon [França Insubmissa] é considerado hoje, por vários analistas, como um ‘Cavalo de Troia’ na sociedade francesa, sendo utilizado pelos grupos muçulmanos extremistas. E creio que este grupo político, este movimento político, de facto, tem sido utilizado largamente.”

E dá um exemplo concreto de violência: Posso dizer que, há dias, foi assassinado um jovem numa estação na cidade de Evry. Esta cidade está situada na região parisiense e nós temos lá uma comunidade de francos-dominicanos, que trabalha muito com esta população de origem estrangeira, em particular africana. Portanto, a violência é crescente. Isso é um facto.”

O que diz o Relatório da AIS?

O mais recente Relatório da Fundação AIS sobre a Liberdade Religiosa no Mundo, publicado a 21 de Outubro e reportando o período entre Janeiro de 2023 e o final do ano passado, reconhece que “após o ataque do Hamas em Israel, a 7 de Outubro de 2023, e a subsequente guerra em Gaza, os incidentes anti-semitas e antimuçulmanos aumentaram em toda a Europa”, mas também contra a comunidade cristã. E França é um sinal disso.

“França – pode ler-se no Relatório da Ajuda à Igreja que Sofre – registou cerca de 1000 incidentes anticristãos em 2023, sendo que 90 por cento deles foram ataques a propriedades religiosas cristãs.”

O assassinato do Padre Hamel, ainda presente

Quando se fala de violência contra os cristãos, há um caso que ganha relevo na memória da comunidade. O assassinato, em plena Igreja, do Padre Jacques Hamel, de 85 anos de idade. O crime, executado por dois extremistas islâmicos que juraram fidelidade ao Daesh, ocorreu há nove anos, a 26 de Julho de 2016.

Sinal de que este crime continua bem vivo na memória dos franceses, este ano, na data em que se assinalou o assassinato do sacerdote – que o Papa Francisco referiu como sendo “um mártir” –, o Estado Francês outorgou-lhe, a título póstumo, a Medalha Nacional de Reconhecimento das Vítimas do Terrorismo.

Este caso ocorreu há quase uma década, é verdade, mas arrasta consigo ainda muitas questões. Segundo o frade José Luís Monteiro, é exemplo de que “o próprio governo francês não sabe mais como lidar com o extremismo islâmico”.

Apenas assaltos ou algo mais?

Toda esta violência que se tem verificado no país, diz ainda o dominicano, “reenvia a população, que antigamente seria de origem cristã, a colocar-se diante da interrogação sobre os próprios valores, sobre as próprias raízes”. “E isto cria um movimento subterrâneo que não deve ser sobrevalorizado, mas que é muito interessante e que dá dinamismo à Igreja Francesa”, acrescenta.

O frade dominicano conclui, dizendo que “esta é uma situação que vai continuar a evoluir”.

Podemos ter momentos extremamente graves de violência, infelizmente, como os roubos aos quais temos assistido. Aí é difícil saber se é uma vaga simplesmente de ladroagem, por assim dizer, de igrejas, de espaços religiosos, ou se é algo pensado realmente para prejudicar o cristianismo na França. Deixo a interrogação. Em todo o caso, é uma constatação em que devemos colocar algumas nuances para não fazer uma leitura extremista, mas também para ver aquilo de positivo que está a acontecer na França, apesar de todos estes sinais de grande fragilidade.”

Paulo Aido | Departamento de Informação da Fundação AIS | info@fundacao-ais.pt

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *


The reCAPTCHA verification period has expired. Please reload the page.

Relatório da Liberdade Religiosa

O princípio da “laïcité” (separação entre Estado e religião) consagrado na Constituição, e a Lei de 1905 em França, são as pedras angulares tradicionais das relações entre Estado e religião. A recente Lei Anti-Separatista, contudo, promulgada em resposta ao crescente radicalismo islâmico, suscita preocupações de crescente intromissão governamental e regulamentação de áreas da vida relacionadas com religiões ou crenças.

FRANÇA

918 125 574

Multibanco

IBAN PT50 0269 0109 0020 0029 1608 8

“Caros amigos, agradeço a cada um de vós por esta obra de solidariedade. Não se cansem de fazer o bem, pois o vosso serviço dá fruto em inúmeras vidas e dá glória ao nosso Pai do Céu.”

PAPA LEÃO XIV

© 2024 Fundação AIS | Todos os direitos reservados.