IGREJA NO MUNDO
PAQUISTÃO: Um homem invulgar
O exemplo de um padre que dedicou a vida aos Cristãos do Paquistão
Um homem invulgar
Em mais de 45 anos de sacerdócio, o Pe. Emmanuel Yousaf tem-se destacado na defesa da pequena e frágil comunidade cristã do Paquistão. Ele não é um simples padre. A defesa das vítimas da lei da blasfémia ou das raparigas cristãs raptadas e forçadas a casar têm sido algumas das lutas em que tem estado mais empenhado. O Pe. Yousaf é um exemplo da coragem na defesa das minorias num país onde a liberdade religiosa é espezinhada quase todos os dias…
Esta semana foi divulgado, em Lisboa e a nível internacional, o mais recente Relatório sobre a Liberdade Religiosa no Mundo. Neste documento, um dos mais importantes publicados em todo o mundo, aparece em destaque a figura do Pe. Emmanuel Yousaf. Durante mais de 45 anos como sacerdote, ele já salvou a vida de muitas pessoas vítimas de injustiça e de perseguição religiosa no Paquistão, e teve um papel essencial na defesa da dignidade dos Cristãos. Director da Comissão Nacional de Justiça e Paz do Paquistão, o Pe. Yousaf é também um grande amigo da Fundação AIS. A sua história mostra que é sempre possível contrariar as adversidades e lutar pelo bem comum. Mesmo num país onde os Cristãos podem ser condenados à morte acusados de blasfémia por terem bebido, por exemplo, um simples copo de água de um poço. Como aconteceu com Asia Bibi, uma cristã, mãe de cinco filhos, que hoje vive no Canadá e que não chegou a ser enforcada graças apenas a uma poderosa campanha internacional que envolveu, entre várias instituições e personalidades, a Fundação AIS e o Pe. Emmanuel Yousaf.
Militante do bem
Mas são muitas as histórias da vida deste homem que se tem destacado na defesa dos mais fracos, dos mais humildes e perseguidos no Paquistão. No Prefácio do Relatório sobre a Liberdade Religiosa no Mundo, lançado terça-feira, dia 20 de Abril, em Lisboa e nas principais capitais europeias, o Pe. Emmanuel conta algumas das lutas em que esteve envolvido ao longo destes anos. Merece ser lido. “Quando os cristãos que trabalham nos campos e fornos de tijolos não receberam a sua devida porção de trigo ou arroz, dirigi-me aos senhorios e proprietários dos fornos pedindo-lhes que dessem salários justos e pusessem fim a esta injustiça. Quando descobri que rapazes e raparigas da minha paróquia não recebiam a educação que mereciam, criei escolas e residências para estudantes. Trabalhei em comunidades rurais em que os cristãos não eram respeitados devido à sua fé e fui proibido de entrar em lojas, restaurantes e cafés…”
O contágio da pobreza
O relato prolonga-se por vários parágrafos em que descreve as lutas em que esteve envolvido. Há pormenores que merecem ser sublinhados. São pequenas notas referentes ao quotidiano dos Cristãos, uma pequena comunidade religiosa que tem sofrido humilhações e violência perante o silêncio cúmplice do mundo. Diz o Pe. Emmanuel que, em muitos lugares onde costumava ir, “os nossos fiéis não podiam [sequer] tocar em copos ou outros utensílios alimentares utilizados pela comunidade dominante”. Absolutamente terrível. Os Cristãos a serem olhados como seres inferiores, impróprios, como se transportassem uma doença, como se a pobreza fosse contagiosa. Entre as histórias que conta, o Pe. Emmanuel Yousaf recorda as raparigas cristãs que são sistematicamente roubadas às suas famílias. É um drama imenso que continua escondido no Paquistão. A Fundação AIS tem procurado denunciá-lo também ao mundo. Mas o mundo parece preferir fingir que não sabe, que não escuta os lamentos destas famílias, destas raparigas que por vezes são apenas crianças… “São crianças que, apesar de serem menores, são raptadas, forçadas a converter-se e a casar, e que também sofrem violações e outros abusos. A situação destas raparigas demonstra que viver como uma minoria religiosa no Paquistão está a tornar-se cada vez mais um problema.”
A história de Salamat
O Pe. Emmanuel conta-nos ainda uma história que revela em toda a sua tragédia como pode ser dramática a vida dos Cristãos no Paquistão. É a história de Salamat Masih e dos seus dois tios. Salamat, de apenas 12 anos de idade, foi acusado de escrever comentários blasfemos sobre o Profeta Maomé. Os dois tios também foram acusados. O miúdo nem sabia ler nem escrever. Isso, no entanto, para as multidões em fúria, vale pouco. Os três foram acusados de blasfémia. Como muitas vezes acontece nestes casos, houve uma tentativa de assassinato. Quiseram fazer “justiça” pelas próprias mãos. Os três foram alvejados. Um dos tios morreu, o outro ficou ferido, assim como Salamat. “Trabalhei incessantemente com o advogado da família para anular a sentença e acabámos por ser bem-sucedidos. Infelizmente, o juiz que os absolveu foi também assassinado a sangue-frio pelos extremistas…” Esta história, dramática e triste, é, infelizmente comum no Paquistão, um dos países mais perigosos do mundo para os Cristãos. O Pe. Emmanuel Yousaf agradece, no texto que escreveu para o Relatório sobre a Liberdade Religiosa, o trabalho e a dedicação da Fundação AIS. Na verdade, nós é que temos uma dívida de gratidão para com ele, para com o Pe. Emmanuel, que é, de facto, um homem invulgar!
texto por Paulo Aido,
Fundação Ajuda à Igreja que Sofre
(Voz da Verdade 24.04.2021)